domingo, 4 de janeiro de 2009

Balseiros - III

Foto: Entardecer no Rio Uruguai - Fonte: Internet

O início da colonização

Para compreendermos esse processo de ocupação da região oeste de Santa Catarina, é imprescindível a menção dos fatos que caracterizaram o maior acontecimento de caráter popular dessa região e do Brasil – a Guerra do Contestado.

Vários motivos estiveram envolvidos nesse episódio. Entre eles a disputa de território entre Paraná e Santa Catarina, a luta dos caboclos pela posse da terra, a oposição ao imperialismo americano (representado pelo sindicato Farqhuar), a atuação do coronelismo e a forte presença da crença messiânica, que servia de acalento frente ao abandono a que estavam submetidos.

Esse conflito pode ser caracterizado como o divisor de águas, no processo de ocupação e modelo econômico local. A região antes habitada pelos caboclos, que tinham uma economia de subsistência, sendo a erva-mate seu principal produto de comercialização. Aos poucos essa economia passa a ser exploratória, pois atende à lógica capitalista e submete a população nativa ao novo modelo.

Com o fim da Guerra do Contestado, as Companhias Colonizadoras passam a lotear as terras do oeste catarinense e a vendê-las a um preço acessível. Os ‘novos colonos’, no entanto, deparam-se com o habitante local. É inevitável o confronto cultural, já que as percepções de mundo e de vida são muito diferentes. Os migrantes são vistos como superiores porque seu trabalho gera opulência e acúmulo de mercadorias. Sua concepção de riqueza está centrada na produção de bens em abundância; para o caboclo, no entanto, o trabalho é visto como meio de obter a sobrevivência. Por isso, foram chamados de ‘preguiçosos’.

O caboclo não consegue conviver com essa visão capitalista, introduzida na região pela colonização, patrocinada por companhias colonizadoras. Estando à margem dessa sociedade e não tendo dinheiro suficiente para adquirir uma propriedade, o caboclo torna-se a força de trabalho nas lavouras do novo proprietário, ou então são isolados em regiões distantes. Poli assim descreve essa situação: Com a instituição da propriedade privada e com as concessões de grandes áreas a quem tivesse prestígio político, os habitantes delas passaram a ser empurrados para terras mais distantes, onde não havia colonização ou reclamação da terra pelos proprietários, ou, então, permaneciam em lugares onde as terras não prestavam à exploração pecuária ou para as atividades agrícolas mais racionalizadas.

De posse da terra, os colonos recém-chegados dedicaram-se à abertura de estradas, à derrubada das matas e ao cultivo de novos produtos a serem comercializados. Dessa forma, temos na região outro modelo econômico implantado, no qual os colonos dedicam-se à propriedade rural familiar, e além de produzir toda a sua subsistência, concretizam o grande sonho de acumular riquezas.


Fonte: Trabalhadores do Rio - Os Balseiros do Rio Uruguai - Noeli Woloszyn



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Capítulo III - Apocalíndio segundo Xamã-tô-Prèy



Ele caminhou trôpego por entre os corpos esparramados, as moscas azuladas e o fedor da morte.

Os urubus se postavam enfileirados, asas abertas, na linha da coxilha, enquanto uma nesga de luz começava a surgir atrás, emoldurando-os contra o firmamento ainda opaco. Alguns deles revoavam alto, em círculos, sobre a fumaça azulada da manhã.

Não se escutava mais os gritos alegres das crianças nas cabanas, nem se viam mulheres trazendo água do rio. Algumas delas jaziam de pernas abertas ao lado da trilha, a cumbuca pela metade, a gotejar lenta seu veneno leitoso sobre a grama.

Homens, poucos. Os que restavam na aldeia eram velhos e fracos. Foram os primeiros a morrer, ainda quando se podia velar-lhe a alma. Os novos haviam partido há dias, descendo o rio, onde tinha mais pinhas e as pacas vinham quase a lamber-lhes os pés, contavam. Certamente estariam mortos também, pois era do mesmo rio que bebiam.

Primeiro foi um dos velhos. Logo outro, e outro mais. Nos outros dias as crianças e a mulheres, arroxeavam os beiços, se contorciam e morriam como formigas em que se verte água quente.

Quando o cacique proibiu que se bebesse do rio, e os mortos iam sendo enterrados, vieram os Zugs na madrugada, saídos em bando de dentro do mato. Primeiro mataram com tiros, os que ainda dormiam. Depois com facão os que tentavam debandar para o lado do rio.

Ele a tudo assistiu acovardado, tremendo entre o taquaral, onde fora, muito cedo, buscar galhos para a cerimônia dos mortos da noite.

Só ele estava vivo. Ele, e talvez a menina Xa-Cunhã, que um Zug havia levado embora, dias antes, trocada à mãe por um deus morto espetado numa cruz de pau. Teria sido o deus derrotado que envenenara a água, como punição?...

Ainda cambaleante, chegou à ponta do mato, de onde saíram os brancos. Apoiou o pedaço de lança no chão e debruçou-se nela.

Anos mais tarde, quando o progresso chegou à margem sul do Iguaçu, as toras arrastadas, vez que outra, removiam das macegas, cabelamas e ossos. Um dos peões do Coronel encontrou um esqueleto transpassado encostado num pinheiro grosso. Afastou-o com nojo e começou a cortar o pinheiro, bem embaixo, com o machado, para fazer a barriga, determinando o lado em que ele deveria tombar. Outros peões já chegavam com os serrotes para cortar do outro lado.


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“Aí chegando com as maiores cautelas, a um sinal convencinado, deram o ataque. Estabeleceu-se uma confusão enorme: gritos, pulos, imprecauções, um berreiro infernal por parte dos selvagens. Não contam os expedicionários, mas é fácil prever terem feito eles uma boa chacina, (...)”.


“O pavor e a consternação produzidas pelo assalto foi tal, que os bugres nem pensaram em defender-se, a única coisa que fizeram foi procurar abrigar com o próprio corpo, a vida das mulheres e crianças. Baldados intentos !! Os inimigos não pouparam vida nenhuma; depois de terem iniciado a sua obra com balas, a finalizaram com facas. Nem se comoveram com os gemidos e gritos das crianças que estavam agarradas ao corpo prostrado das mães! Foi tudo massacrado”.

“A turma não tinha nem tempo de carregar a arma de novo. Iam de facão mesmo, subindo e descendo, cortando. O pai lembra de uma meninota que saiu correndo pro mato quando o primo dele agarrou ela pelos cabelos e desceu o facão. O aço desceu pelo ombro até as partes (vagina). Cortou que nem bananeira. Ao ouvirem a gritaria e os tiros dos caçadores, os bugres procuravam suas armas, como não as encontravam, debandavam de forma desesperada mato adentro, deixando tudo para trás.”


Trechos extraídos da obra: MATAR BUGRES: (...), de Flamariom Santos Schieffelbein, que por sua vez cita o Jornal “O Novidades” dos anos 1904 e 1905. Fotos da mesma obra; na primeira, acampamento Xokléng em 1910; na segunda, patrulha de bugreiros (caçadores de índios) - ao centro, de camisa escura, lenço no pescoço e um facão no ombro direito, Martinho Marcelino de Jesus, o Martin Bugreiro, o mais conhecido e sanguinário bugreiro da época.




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O HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA
Projeto Estímulo à Leitura




Meta



“Estimular os alunos para leitura como ação inteligente e reflexiva, garantindo o acesso aos saberes lingüísticos necessários para o exercício da cidadania, direito inabalável de todos.”

Vamos iniciar mais uma etapa deste projeto em fevereiro de 2009. Receberei cerca de 150 alunos, na faixa de 11 anos, vindos das escolas municipais. Todos chegando para os 6ºs anos. Todos curiosos para uma nova etapa de mais quatro anos nesta escola estadual. Eles chegam com olhinhos assustados, enfim, tudo é novo.
Para mim também, pois acabo de “deixar” as turmas de 2008 para trás... De uma forma gratificante... Pois passamos o ano letivo juntos, explorando o máximo da literatura e das leituras que considerei adequadas para eles. Eles também estarão empolgados com a continuação... Quem sabe o projeto não se expande e terei uma colega para me ajudar com as turmas de 7ºs anos?

A diretora da escola e eu temos pedido ao “Papai do Céu” esta Graça... Se conseguirmos aprovação de nossa Superintendência local estes alunos teriam continuidade e avançariam mais em seus estímulos literários.

Quem sabe, você, leitor e amigo das Letras da Torre não deixa um comentário nos ajudando no pedido? Pode ter certeza que eu encaminharei esta postagem à pessoa responsável, prometo!

Outro detalhe pertinente é a questão dos números de turmas.
A cada ano estamos recebendo menos alunos para os 6°s anos. Diminuímos uma turma, de seis teremos cinco.

Os pais estão pensando melhor em colocar filhos no mundo ou é impressão minha?
Também nessa crise do país... Bem, deixo esta parte tão polêmica para meu amigo Quasímodo, afinal ele é o anfitrião deste blog e sabe discursar plenamente sobre questões sociais, econômicas e assuntos afins.

Voltemos ao assunto LEITURA!

Já estou iniciando meu novo planejamento. Tenho pensado nos tipos de leituras que irei apresentar. Meu objetivo geral é desenvolver a competência de leitura do aluno buscando torná-lo um leitor eficiente.

“... A didática pode ser envolvente. Em vez de longas fórmulas para decorar problemas que envolvam áreas distintas do conhecimento, fontes diversas como livros, internet e colegas. Em vez do mecânico, o lúdico. Em vez de teórico, o prático contido num poema ou revista... O aluno estimulado se transformará em um pesquisador ávido. São maiores as chances de que venha a ler Machado de Assis, por sentir-se seduzido pelo prazer da leitura, e não porque foi obrigado.” (Gabriel Chalita).

Darei uma atenção especial ao tema “Valores Humanos”, incutindo nos alunos o respeito pelo outro, trocando gentilezas, sensibilizando-os a praticá-las no dia-a-dia, além dos portões escolares. Para isto já estou preparando leituras sobre cidadania, exercícios das palavrinhas mágicas, ética ,convivência harmoniosa, entre outros.

No plano de ação eu organizo as leituras em temas, separando-os em atividades mensais.

No mês de fevereiro eu reservo para fazer a sondagem da clientela, ou seja: chamarei os alunos pela primeira vez, eles lerão e interpretarão as leituras que eu pedir.

Lembrem - se que o trabalho principal do projeto é atendê-los individualmente. Isto acontece sistematicamente durante o ano letivo. A sondagem me indicará o nível de leitura e interpretação de cada um. As leituras não devem ser longas, apenas de uma folha, pois trata - se de uma verificação da oralidade e capacidade de contar o que leu.

Após este primeiro contato começo a agrupar os alunos por níveis. Os que apresentam mais dificuldades serão chamados mais vezes para estarem comigo. Aqueles que já dominam a leitura e interpretação eu vou aumentando o grau de dificuldades das leituras. Ou seja, é necessário um grande tipo de leituras para que o trabalho apresente resultados.

Normalmente um aluno tímido, no mês de fevereiro, vai se desinibindo gradualmente e em maio ou junho já está bem mais fluente e até fazendo gestos com as mãos na hora de me contar o que leu. Quando eles terminam a leitura eu costumo dizer: “Conte-me o que você leu”. Li, certa vez, que não é aconselhável perguntar o que entendeu da leitura.

Na primeira vez que ouvem esta frase, alguns estranham, mas com o passar do tempo eles automaticamente já iniciam a interpretação assim que terminam a leitura. Tudo é uma questão de jeito e treino.

Estes alunos são chamados durante as aulas de Língua Portuguesa, eu trabalho fora da sala de aula, como auxiliar das professoras regentes. Não há problema em tirá-los da sala, enquanto um está comigo o outro está a caminho da sala e já chama o próximo. Funciona sem tumulto algum. Eu cronometro o tempo disponível e quem vai ser chamado naquele momento, o aluno que terminou já espera que eu diga o nome do próximo colega.
Não há também perda de tempo, caso o aluno demore no percurso de volta para a sala, pois imaginem quem não quer sair por alguns minutinhos e ir para a Oficina? Se ele demora os colegas cobram-no ao chegar à sala.

Aliás, o único problema (se é que isso é considerado problema...) é quando eu apareço na porta da sala. No início de cada aula existe aquela expectativa de meu aparecimento. Quando surjo, vejo aquela cena de burburinhos falando meu nome e levantando o dedo, “me chama professora”, “faz um “tempão” que não me chama”, e assim por diante.

Isso também é sanado rapidamente, pois faço a famosa “punição” do “impedido de ir à Oficina” para quem apresenta um comportamento inadequado. Não pensem que eu também não sou questionada, caso me atrase a chegar ás portas. Eles ficam tão ansiosos para a leitura que me vigiam o tempo todo.

Como sou a única a fazer este trabalho e tive seis turmas (2008), elaborei um horário de acordo com as disponibilidades deles com as professoras regentes ,portanto, eles sabem perfeitamente quando apareço.Eis porque também preciso de uma colega me ajudando. Os alunos gostam tanto destes momentos prazerosos e eu não tenho disponibilidade de atender a todos (lembrem-se do meu pedido lá em cima...). Seria excelente contar com o apoio de mais alguém! Deixem-me sonhar!

A partir do final da sondagem já inicio com os temas, que distribuo entre os outros meses.

Na próxima postagem colocarei aqui este Plano de Ação em questão.










Aproveito par divulgar e-mail que chegou à Torre, enviado pela Géssica, e que se adequa a este contexto:

Pessoal, fiz uma comunidade no orkut de Atividades de Leitura. Quem quiser participar fique a vontade. http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=79827409

A idéia da comunidade surgiu após as aulas divulgadas no blog Projetos e Idéias. http://projetoseideias.zip.net/

Beijos a todos

9 comentários:

Géssica disse...

Passando para uma visita e para avisar que adicionei o "Letras da Torre" como indicação de site no meu blog, Projetos e Idéias ( http://projetoseideias.zip.net )
Beijinhos p Quasímodo e Krika.

Anônimo disse...

Meu querido amigo, tuas histórias são partes de uma História , desconhecida por muitos.
Parabéns, que te dize a não ser isso.
Tua contribuição para nosso enriquecimento, é ímpar.
******
Parabéns Krika, ainda em férias, mas já com a bola toda , na elaboração do projeto para o ano, que está iniciando. Interesse e empenho são armas que muitas pessoas deveriam ter. Só assim nossa "escola", seria realmente um canto bom de estar.
****
Abraço aos dois, pelo empenho e dedicação.

Anônimo disse...

Não sou anônima, algo deu errado....sou "retalhos"....do coments anterior.
Abraço.

Quasímodo disse...

Amiga Krika;
Acredito que o Projeto que desenvolves merece, sim, o apoio e o incetivo dos òrgãos a que estás vinculada, principalmente por parte da Superintendência Local, que me parece ser a primeira instância na estrutura educacional de teu Estado.
Torcemos muito aqui para que isso se dê, seja atravé da nomeação de mais uma pessoa, como citas em teu texto, seja através do fornecimento de livros e revistas para a Oficina, ou, quiçá, até da expansão dessa forma lúdica mas séria de educar, às demais comunidades escolares.
Tens a teu favor os resultados obtidos, consubstanciados nas declarações dos alunos na postagem anterior.
Independente disso, a Torre estará aqui, sempre à tua disposição para divulgar teu trabalho, e também para pedir mais uma vez, que as pessoas que tiverem em casa revistas e livros que possam enviar para a Oficina, que entrem em contato contigo, pelo endereço de e-mail que inseri ao final da tua postagem.
Quanto ao decréscimo no número de alunos (e de filhos) acho mais prudente deixar o assunto com especilaistas das respectivas áreas: Sociológos, Economistas e Sexólogos. Estaria invadindo seara alheia, em que competência e conhecimento me faltariam.

Um grande abraço, amiga. Sucesso cada vez maior ao Projeto de Estímulo à Leitura e à Oficina.

PS. A foto da menina e o livro, teimou em não aparecer.

krika disse...

Géssica,minha amiga "Kokada", sucesso em sua comunidade. Seus projetos e idéias são maravilhosos.
Vamos divulgá-los as professoras,pois na forma em que você apresenta no blog já está tudo prontinho para colocarem em prática. E Grata por permitir minha presença por lá também.
Girassol! Não sabia que Retalhos era você...Grata pelo incentivo!
Companheiro "bloguista" cá estou...
Vamos ver o que houve com a menininha da foto...
Amigos, aproveitem a "deixa" de Quasímodo e postem uma mensagem de apoio para meu projeto. estou pleiteando junto a Superintendência local uma colega de trabalho( professora)para que os alunos dos 7ºanos em 2009 tenham a continuidade das leituras de 2008!
Gratíssima a todos!

Géssica disse...

Obrigada, Krika. Talvez tais idéias não surgissem se não a tivesse conhecido.
T adoro!

Anônimo disse...

É...colonizamos tudo "direitinho",não foi?
Eles eram selvagens..nós,homens brancos com boa vontade...pra fazer deste pedaço de chão um lugar próspero e organizado...
Eca!
Um dólar como todos os bugreiros eram cristãos e rezavam antes de irem pro serviço...
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Sabendo um pouco mais sobre nossa história...damos razão a quem tem.
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Beijos!
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Géssica disse...

Agora é a vez de deixar meu recadinho a Quasímodo. Era p eu ter feito isso antes, mas no dia q deixei meu recado a Krika, tive q sair daki e não pude enviar o recado seguinte.
Vamos lá.
Quasímodo, ou seria Juca, ou seria....???? Bom... qualquer que seja de vcs que esteja dando a força p meu blog e para minha comunidade merece não apenas meus sinceros agradecimentos, como meu grande abraço de respeito e carinho. Fico sem palavras p mencionar quão grata estou............. Então, de todas as palavras que procuro, só encontro duas: muito obrigada!!!!

Quasímodo disse...

Amigos e amigas... Kokada, Retalhos, companheira Krika, Milly, e todos que por aqui passaram em silêncio: muito obrigado por prestigarem a Torre.

Kokada, não agradeça ao Quasímodo nem ao Juca... O País é que deve agradecer à pessoas como tu e Krika.

Boa semana a todos...

 
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