domingo, 28 de dezembro de 2008

Retrospectiva 2008




Se a Globo pode, a Torre também “pooode”, oras. Só não terá Roberto Carlos a cantar músicas milenares. Nem Simone anazalando corredores de Shopping Centers... “...entahum é natahum...”

Mas vamos lá...

2008 iniciou normal, medíocre até. As férias a que teria direito troquei por vinte e quatro dias em que fiquei em Passo Fundo, dando atenção e cuidados à mamãe no Hospital São Vicente de Paulo. Ela, a mamãe, não o santo nem as férias, havia quebrado o fêmur ao tentar pular uma cerca de arame farpado lá no interior de Lagoa Vermelha, no distrito de Santa Luzia. Isso foi em Novembro de 2007. A velhinha é danada. Um exemplo de vida, lucidez e bondade. E osteoporose. Mas não sossega.

E assim seguiu o ano de 2008 até o dia 5 de maio, melhor, a noite, mais precisamente por volta das 20 horas.

Eu voltava para casa, depois de visitas a clientes e de ter passado no bar do “Seu” Antônio e comprado uma garrafa de cerveja que pretendia tomar mais tarde, depois da janta, em frente à TV, assistindo a um jogo de futebol que não lembro qual.

Num cruzamento, um moço armado com um Chevette, manobrou indevidamente à esquerda e atingiu-me em cheio, bem debaixo do farol. Resultado: esmigalhou-me a perna esquerda. Ah, eu pilotava uma possante motocicleta Honda Titan, 125 cc, ano 1998. (A cor importa?... vermelha).

Além da perna, os danos materiais foram de pequena monta. Está escrito no Boletim de Ocorrência, que guardo comigo: “danos materiais de pequena monta”. A clavícula que havia quebrado dois anos antes, num acidente na estrada, desta vez nada sofreu. A cerveja Colônia permaneceu intacta no bagageiro. Acidente besta. Mas prensou a perna entre o pára-choques do carro e o motorzinho da moto. Na perna o estrago foi grande.

No hospital, onde permaneci por uns dias, enquanto o doutor Adriano tentava encaixar as pecinhas de ossos, como num quebra-cabeça infantil, lembrei-me do que alguns colegas diziam, quando eu tentava racionalizar problemas comuns do trabalho... “ele ri até de fratura exposta”... Não contava com tanta literalidade.

A partir desse episódio, minha vida tomou novo rumo. Um acidente não quebra-nos os ossos somente. Quebra-nos a rotina, os planos e a conta bancária. Quebra-nos também os paradigmas e preconceitos.

Serviu para que eu enxergasse e sentisse humanidade em pessoas que antes olhava com distanciamento. Aqueles chefes, antes inacessíveis, onipresentes e onipotentes, semideuses imaginados num pedestal dourado, não passavam mesmo disso: imaginação minha. Foram extremamente amigos e solidários. Extrapolaram, em muito, suas obrigações legais e a relação trabalhista formal.

Passei o inverno cheio de pinos. Parecia uma antena de TV, daquelas antigas, que se armava em cima das casas. Era difícil dormir. As cobertas enroscavam nos parafusos, que não eram pequenos.

Entre os jogos da Eurocopa, em que torci freneticamente por Portugal do Felipão, vinha para a frente do PC. Estreitei laços com pessoas que conhecia superficialmente da sala A do Chat Terra-Idades. Imensas virtudes e bondade encontrei ali. Não citarei nomes, mas foram tantos. Fui à luta, inscrevi-me em cursos on-line que há muito tempo queria fazer e que, pelo açodamento do dia a dia, considerava irrealizável.

Uma amiga em especial, dentre tantos que ficaram ao meu lado durante esse período difícil, intimou-me (é esse o termo) a criar uma página na net. A virtualidade é relativa.

Relutei inicialmente, mas daí se começou a erigir-se a Torre. Letras da Torre. Quasímodo ganhou forma, ou disforma. Juca Melena nasceu já gaúcho guapo e crescido. Krika integrou-se mais tarde, trazendo seu magnífico projeto de estímulo à leitura.

Em Portugal e demais países de língua portuguesa consolidavam-se o MIL – Movimento Internacional Lusófono e a revista Nova Águia, a que muito conscientemente aderi.

O ano de 2008 foi bom por tudo isso. E eis que chegam as festas de Natal. O que se prenunciava como um dia nostálgico e solitário, transformou-se numa romaria de afetos. Pela manhã, colegas. À tarde veio minha irmã e meu sobrinho, que há anos eu não via.

Dia 26 fui à perícia médica que haviam marcado para as 10 horas da manhã. Reconheceram finalmente meu direito de receber dois meses de salário-acidente que me haviam suspendido inexplicavelmente, deixando-me à míngua. Burocracias.

À tarde chegou o carteiro trazendo-me os dois números da revista Nova Águia publicadas em 2008, gentilmente enviados de Lisboa pela querida amiga Alma Lusa – Luzia. As edições são semestrais. Magnífica prenda, amiga Lusa.

2009 surge no horizonte trazendo boas perspectivas. Dia 21 de janeiro está marcada uma nova revisão na perna, radiografias e o escambau. Dependendo dos resultados, talvez removam o gesso. Estou com saudades de vê-la nua. No ombro, onde residem a mais tempo sete parafusos e uma placa de platina, não irei mexer. Não incomodam, salvo quando se anuncia chuvas ou
quando tento passar pela porta giratória do banco. Apita.

Que venha o ano novo com força, com tudo o que ele tenha de direito.

Meus pedidos são simples. Saúde aos amigos e amigas, e que tudo o que o ano de 2009 me trouxer, me sirva para me fazer um ser humano melhor.

Na próxima publicação, a Torre retomará a história dos balseiros do rio Uruguai.
___________________________________________________




O HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA


Transcrevo as mensagens que os alunos deixaram no encerramento do ano letivo de 2008. Foram colocadas no mural da Oficina.
Os numerais após os nomes correspondem aos números das salas de aulas.

Oficina me facilitou a ler e conversar; J. Paulo - 7
Se todas as escolas tivessem um projeto legal assim o Brasil seria um país de leitores; Fabrício - 12
Ficarei com saudades; Luan Pereira - 7
Muito obrigado pela educação e carinho que você nos trata; Brener - 7
Seu trabalho é muito importante para nossa escola, pois nos incentiva a ler cada vez mais e sempre que passamos em frente daquela salinha, toda decorada, dá vontade de parar e observar as novidades. Parabéns! Alana - 9
A Oficina é linda, bem enfeitada; Leonardo -12
Que ela seja sempre assim. Bonita e bem decorada; Nayara - 7
Gosto da decoração; Pietra -12
Nós agradecemos a sua paciência conosco. Obrigado; Alisson - 9
Você me faz melhorar muito; Gabriely -12
Que Deus abençoe muito a Oficina e que todas as crianças tenham interesse em ler; Ana Flávia - 11
Trabalhe bastante e chame muitas pessoas para a leitura; Gabriel Prado -12
Quero que a oficina cresça cada dia mais porque ela é muito boa; Isla - 9
Lendo estou aprendendo; Fernanda -12
Aí dentro é super legal, tantos livros e revistinhas que não dá pra escolher um só.Super fantástico!Continue assim! Welerson-12
O que você faz é muito legal, pois existem alunos que estavam precisando... Eu achava que minha leitura era boa, e agora, com certeza melhorou mais. Eu queria que tivesse o ano que vem; Micaela - 8
Obrigado por estimular as mentes das crianças para a alfabetização; Renan - 10
Oficina é espetacular! Joelen - 11
Muito obrigado pelos seus livros, continue assim; Lucas - 7
Nunca desista; J.Paulo -12
O poder da leitura transforma sua vida em contos de fadas; Karen - 10
Seja feliz não importa o que aconteça; Wellington -12
Espero que você continue aqui na escola por muito e muitos anos. Este projeto é lindo e ajuda muito. Obrigado; Rômulo -12
É muito legal, mas ao invés de ser nas aulas de Português. Poderia ser de manhã ou no dia de 4 aulas; Ana Luiza -12
Você foi e sempre será a melhor professora de leitura. Adorei seus textos e estímulos. Você é a heroína da leitura. Obrigada; Elizandra - 10
Obrigado, não é toda escola que tem; Thales - 11
Espero que Oficina fique melhor do que é hoje; Andressa - 11
Ajudou-me muito neste ano e espero que ajude assim no próximo ano; Vilian – 7
Que a Oficina continue, porque assim vamos para a frente; André, Rafael -11
A Oficina jamais deveria parar de funcionar, nem por nenhum motivo ! Alisson -10
Continue sempre assim, cheia de novidades e que Deus te ilumine muito; Taynara Santos - 7
Eu quero agradecer porque este projeto me ajudou a me comunicar com as pessoas; Mayara -11
Eu acho a Oficina sensacional, pois nos ajuda a ler e também a entender; Rafaela- 11
A leitura é fundamental para a vida; Luma – 10
Deixo meu muito obrigado por tudo que tem feito pela minha leitura; Mariana -11
Oficina maravilhosa e especial, continue assim; Elizandra - 7
Obrigado pela sua dedicação; P.Maurício - 11
A Oficina nos atende com muito carinho ,capricho, dedicação e companheirismo, para aprendermos outros tipos de leituras;Thales - 10
Que legal, a Oficina é o máximo, e adoro o mural; Débora - 10
Oficina eu lhe agradeço por existir; Ana Carolina - 7
Espero que continue sempre esta gostosura! Ana Carolina - 11
Obrigado por ajudar na minha leitura; Luciano - 11
Eu agradeço por você fazer a Oficina; Dagmar - 7
Eu adoro tudo que tem lá, os livros, homenagens, letreiros, etc; Thiago H.-11
Adoro a Oficina, ela nos faz viajar no tempo; Camila-11
Eu gosto de ir lá, a professora é legal e gosto de todos os livros, cada um mais divertido que o outro; Jéssica- 7
Legal as oportunidades e criatividades da Oficina; Tainá-11
Oficina bonita e caprichosa! Wellen - 7
Muito obrigada, você nos ajudou muito e que um dia você possa ganhar cosias boas para pagar o que você faz pra gente; Patrícia Pires - 11
Que seu trabalho dure para sempre; Agda - 8
Eu quero agradecer porque este projeto me ajudou a me comunicar com as pessoas; Muito legal. O próprio nome já diz, que é um estímulo para lermos mais; Mayara - 11
Ajudou-me em todas as matérias; J.P.Angeli - 7
Foi muito bom porque eu aprendi a ler melhor; Matheus11, Gabriely, Franthesco, Leonardo - 12
Porque a gente melhora na leitura; Fernanda, Pietra, Thaynara, Verônica - 12, P.Henrique - 7
Ajuda a desenvolver e estimular à leitura; Larissa-12, Ana Carolina - 11
Muito bom porque quando a gente fizer teatro tem que saber ler bem; Luan Pereira - 7
È o máximo! Por mim eu ficaria o resto da minha vida lendo coisas interessantes; Isabella - 8
È muito legal, pois depois da leitura a gente vê se entendeu ou não; Patrícia Mirian - 11
...E tem um monte de sugestões de livros pra levar para casa!; J. Paulo - 12
Melhorei muito e fiz muitas receitas com as revistas de culinária; Rômulo - 12
A Oficina é uma chance de conseguirmos ter responsabilidade com os livros; Isa Dhara - 8
A pessoa, cada vez mais gosta de ler; Fabiana - 11
Interessante e legal, pois desperta o interesse de todos; Liliane - 11
O que tem de mais legal na escola é a Oficina; Gisele - 8
Ajuda a desempenhar a leitura cada vez mais; Thais - 11
Eu melhorei muito, mas tenho mais a melhorar, prefiro ir mais vezes lá...; Migue l - 12
Eu gostei muito, mas foi muito pouco. Tinha que ser uma aula só de leitura; Eliel - 8
Queria que me chamasse mais vezes e que tivesse uma aula só de leitura; Jonatan - 8
Legal porque temos nossas descobertas. Eu adorei, pena que não posso emprestar livros no ano que vem; Rafaeli - 8
Gosto de tudo e queria que continuasse em todos as salas; Natã - 8
Este projeto ajuda a quem tem dificuldade com a leitura; André - 11
Muito bom, pois não ajuda só a gente, mas nossa família também,porque a gente leva para casa e eles também lêem;Patrícia Pires - 11
A leitura é tudo!; Thales - 11
Dá a oportunidade de conhecer vários tipos de histórias; Marcos - 11
Legal porque ao longo do tempo as pessoas aprendem a ler e interpretar melhor; Thiago H. - 11
Ótimo! Porque quem não gosta de ler aprende a gostar; Camila - 11
Ótimo pois ajuda aos que não se interessavam antes;Tainá - 11
A gente aprende bem melhor, queria que tivesse ano que vem; Taynara Ingrid -7, Mariane - 12
Muito bom para incentivar e treinar a leitura; Tainara Lima - 7
Bom, pois estimula na leitura e no português; Geovane , Thais - 12 J.Paulo - 11
A gente se diverte, eu gostei muito; Jéssica; Caio - 7
Importante para estimular a fazer resenhas; Rafaela - 11
Legal e deveria ficar assim todos os anos; Ana Carolina - 7
Ajuda a aprender e descobrir muitas curiosidades; Sarah - 11
Ajudou bastante!Wellen - 7
Gostei bastante porque ajuda os alunos a se desenvolverem na sala de aula; Renan-10, Nayara - 7
Aprendemos muita coisa interessante; Thales - 10
Bom e ajuda no aprendizado; Vilian - 7
Com certeza nos ajudou muito, nos inspira a ler mais; Bianca, Alisson - 10
Ajuda a ler mais e mais. Quem sabe mais ou menos aprende, nos ajuda a pensar, divertido e gostoso, pois raciocinamos as coisas de outra maneira desenvolve mais na leitura; Natalia, Elizandra, Luma, Karen ,Melissa, Ramon - 10

Agradeço a todos os alunos que entenderam a proposta, de ler, divertindo-se.
Desejo que vocês continuem lendo cada vez mais e que lembrem com carinho desta pequena Oficina.

Krika pediu-me que acrescentasse um comentário. Eu pergunto: e precisa?...

_____________________________

domingo, 21 de dezembro de 2008

Balseiros - II

A efetiva colonização do oeste de Santa Catarina se deu a partir do final da Guerra do Contestado. Esse acontecimento de ordem econômica-político-social estabeleceu nessas terras, antes ocupadas por remanescentes de nativos e caboclos2, os descendentes de imigrantes europeus, vindos especialmente do Rio Grande do Sul.

Os colonos recém- chegados procuram, a partir das condições locais, encontrar subsídios necessários à subsistência e ao acúmulo de capital dentro da ótica capitalista, comum à cultura européia. O confronto cultural entre os caboclos e os ‘novos colonos’ foi inevitável, já que os primeiros tinham uma economia de subsistência, distante da visão européia capitalista.

A região do Alto Uruguai catarinense e gaúcho passa a ser explorada nesse contexto.

Os migrantes buscaram apropriar-se da terra e de todos os recursos naturais existentes na região. A madeira foi uma das primeiras fontes de riqueza. As árvores eram retiradas da mata, levadas até as encostas do rio Uruguai, onde eram embalsadas3 e ficavam à espera da enchente que permitisse o seu transporte até São Borja/RS. Lá eram comercializadas ou seguiam até o Uruguai e Argentina, para obter um preço melhor pelo produto.

A partir da década de 1920, intensifica-se a exploração do corte das matas, que era feita por pequenos proprietários, empresários, empreiteiros ou apenas prestadores de serviço braçal. O trabalho era árduo e realizado de forma bastante rudimentar, baseado na força física do homem, no machado e no serrote. Verifica-se, também, precaríssimas condições climáticas, demográficas, administrativas e de segurança.

O transporte da madeira para as serrarias ou pontos de embarque, era realizado por carroças ou através do arrasto com três, quatro ou cinco juntas de bois. Somente a partir da década de 1940 é que aparecem os veículos motorizados, época em que o cedro começa a ficar escasso e a exploração do pinho torna-se mais intensa.

O ‘negócio das balsas’ desenvolveu-se em vários municípios do oeste catarinense e Alto Uruguai gaúcho. Essa atividade incrementou a economia regional, já que impulsionou a criação de várias serrarias e a melhoria da infra-estrutura nas estradas da região e, ainda, possibilitou a abertura de novos mercados e o escoamento da produção agropecuária dos colonos. Além disso, deu origem a vários municípios, às margens do rio Uruguai.

Retomar a história dos trabalhadores balseiros se justifica, na medida em que algumas cidades, antes objeto da exploração da madeira e transporte através das balsas, estão cobertas pelas águas das barragens construídas nessa região. São igrejas, pontos comerciais, prédios antigos, casas comerciais e praças. Assim, parte da memória e da identidade cultural da região está perdida.

As bibliografias disponíveis a respeito do assunto são poucas, geralmente referem-se a histórias de famílias de balseiros e madeireiros. Dentre essa obras, podemos destacar o livro ‘O velho balseiro’, de Heitor Lothieu Angeli e ‘ Madeiras, balsas e balseiros no rio Uruguai’, de Eli Maria Bellani.

Trata-se de um período relativamente curto no contexto da nossa história, porém faz-se necessário seu registro, pois ainda dispomos de alguns [poucos] balseiros em vida, que estão nos fornecendo relatos importantes para esta tarefa.

2 Originário da miscigenação dos portugueses, espanhóis e nativos. Na região são chamados, também, de brasileiros.
3 Preparação das balsas. As toras eram amarradas umas às outras.





Fonte: Trabalhadores do Rio - Os Balseiros do Rio Uruguai - Noeli Woloszyn


Foto - Rio Uruguai - Internet




-0-



Capítulo II – Elvira


Elvira nasceu Xokléng, mais precisamente Ngrokóthi-tõ-Prèy, ao sul do rio Iguaçu, onde havia muito pinhão, caça e matos extensos, a se perder neles.


Ao contrário de seus parentes Kaingangs que moravam mais ao sul, seu povo Ngrokóti-tõ-Prèy pelo seu cacique, e demais membros da tribo, inclusive os Xamãs e guerreiros jovens com beiços recém furados, não aceitavam pacificamente as propostas do Coronel.

O Cacique Condá, dos parentes Kaingangs, tinha uma tribo estabelecida e de morada permanente, e até roças faziam, queimando os restos das matas que os peões do Coronel derrubavam para arrastar as toras. E até sementes de milho e feijão o Coronel dava para eles plantarem. E até cachaça ganhavam.


Elvira nasceu Xokléng, nas matas ao sul do Iguaçu quando ainda os primeiros tropeiros de mulas passavam com medo pelas picadas que levavam ao rio, no Porto da União.


Elvira nasceu mestiça Ngrokóthi-tô-Prèy cruzada com caboclo do santo José Maria. Moço bonito e de coragem, como contava sua mãe. Diz-que morreu no Irani em defesa do beato, atravessado por uma espada dos regulares. Tornou-se Ngaium – Espírito. Ngaium-Hu – Espírito bonito.


Tudo isso Elvira recordava enquanto lavava o lençol azul, que nem muito sujo estava, afora umas manchas amarronzadas sobre o meio.


Antes de ser Elvira, fora Xá-Cunhã-Tõ-Prèy, mas a recordação era vaga, avivada às vezes pela marca tatuada a fogo na perna esquerda.


Ainda menina fora levada pelo Manuel Pereira, agregado do Coronel nas lidas das derrubadas das matas que ainda existiam mais ao sul, nas terras onde viviam os parentes Kaingangs.


Na casa do tal Manuel, virou moça e aprendeu a falar a língua dos brancos, a lavar roupa e varrer a casa. Aprendeu as letras ajudada por Manuela, a filha mais velha do Manuel Pereira. O nome Elvira foi dado pelo padre das aulas de catecismo, que, junto com Manuela freqüentava na igreja de Dom José. Dizia este ser um nome de branco, que significava “Verdade Suprema”, mais apropriado que o tosco nome Xá-Cunhã-Tõ-Prèy, inculto e pagão. Foi batizada então como Elvira Pereira.


Por ter vindo ainda pequena para a casa de Manuel Pereira, no aglomerado de casas cujo lugar os Kaingangs chavam de Xá-Pé-Kó – pequeno lugar onde se avista o caminho da roça – Elvira sobreviveu à extinção de seu povo.


Contaram-lhe que muitos da sua tribo foram mortos pelos homens do Martim Bugreiro, em tocaias e emboscadas. Poucos em luta direta. A grande maioria, no entanto, pereceu de doenças pegadas dos brancos, como a febre amarela, sarampo e gripe.


Os guerreiros mais valentes e fortes, alguns ainda com o botoque recente enfiado no beiço de baixo, que haviam se embrenhado mata adentro para fugir dos bugreiros e dos capangas dos madeireiros, morreram quando beberam a água pesteada do rio.


Elvira não estava mais lá. E não fosse pela marca na perna esquerda, pouca coisa mais a lembrava a aldeia.


Conheceu Fulgêncio numa noite, quando vieram à casa tratar com Manuel Pereira, três rapazes. Um moreno e forte, outro ainda menino de barba rala, e um alto e bem vestido que trazia no braço uma pulseira que parecia ser de prata. Este era Fulgêncio. O que mais falava com Manuel, a quem chamava de “Patrão” e que parecia ser o líder do grupo. Por entre a porta semi-aberta, que dava da cozinha para a sala, ouviu combinarem que a próxima descida da balsa teria Fulgêncio como prático. Elvira não sabia o que isso significava, mas lhe pareceu ser importante, pois na janta, servida mais tarde, os rapazes pareciam alegres.


Trocaram alguns olhares rápidos e ela foi refugiar-se envergonhada no quarto. Sentia um calor estranho nas faces.


Dias depois Fulgêncio voltou à vila e à casa, agora desacompanhado dos outros moços. Conversou brevemente com seu “pai” na sala e se foi. Nem bem o moço havia saído, Manuel chamou-a e lhe entregou um pacote. Disse-lhe ser um presente do prático Fulgêncio. Correram, ela e Manuela para o quarto e abriram sofregamente o pacote rasgando o papel pardo. Era um corte de seda azul, com flores amarelas e vermelhas. Umas grandes, outras pequenas.


Fez um vestido, que só usava nos domingos, quando havia reza na igreja. Sentia vergonha de usá-lo, e do olhar de inveja das outras moças do lugar.


Meses depois se casaram. O Coronel não foi, mas mandou-lhe pelo Manuel um jarro e uma bacia de louça grossa, enfeitados de flores, parecido com o vestido de seda. Quando foram embora para o Goio-En ela deu à Manuela o jarro e a bacia.


- Mas é presente do Coronel, criatura. Isso é desfeita.


- Pegue minha irmã. É teu. Lá pronde vou tem bastante água. Não vou carecer da bacia e nem de jarro. E o Coronel não precisa saber que te dei.


Lembrava desse dia quando avistou Fulgêncio trotando apressado na beira do rio, balançando os peixes. Tiço ainda não voltara da faixa, onde vendia frutas. Tomara que trouxesse algum dinheiro. Estava sem sal em casa, e o Moura não queria mais fiar.


Estendeu as últimas peças de roupa e entrou em casa. Tiço apareceu na ponte.



Foto: Mulher Xokléng - Internet


-0-

KRIKA

Krika não veio hoje. Temos tido alguns desencontros, por força, talvez, da época do ano e das tarefas que se acumulam.
Seu projeto "Estímulo à Leitura" continuará e contará sempre com o apoio da Torre e de seu anfitrião.
Interessante notar que a partir da publicação de seus textos neste modesto espaço, novas perspectivas se abriram, novos contatos apareceram, o reconhecimento de seu trabalho começa a aflorar.
Iniciativas semelhantes surgiram, como o da professora Géssica, que criou o blog http://projetoseideias.zip.net/ que recomendo a todos que se interessam pelo tema Educação.
Sigamos em frente, amigas. É hora de repensar, fortalecer os ideais, e de nos prepararmos para os embates do próximo ano, que se vislumbram ainda mais desafiadores.
Beijos... Abraços. FELIZ NATAL a todos que, no decorrer de 2008 somaram na Torre.
_____________________________________________________________





domingo, 14 de dezembro de 2008

Balseiros - I


O oeste catarinense foi povoado por migrantes descendentes de italianos e alemães, que vieram das colônias gaúchas a partir de 1917. Esse fato contribuiu para o crescimento dos povoados, que apresentavam algumas dificuldades. Entre elas, estava a de inserir a região no contexto econômico do estado e do país, ocupando áreas desabitadas, produzindo riquezas e atendendo, assim, a lógica capitalista. Com isso, surgiu umas das primeiras possibilidades econômicas da região: a exploração da madeira, que era abundante nas florestas subtropicais e com alto valor comercial.

A madeira era levada até São Borja/RS e de lá para o Uruguai e a Argentina, onde eram comercializadas. Para transportar as toras utilizou-se do sistema de balsas, que consistia em amarrar cerca de cento e cinqüenta a duzentas toras de madeiras umas às outras. Em torno desta atividade, estavam muitos trabalhadores: os peões, que derrubavam a mata e levavam as toras, com juntas de boi até o rio Uruguai, e os balseiros, que se ocupavam no transporte das madeiras.

Esta é uma obra parcialmente ficcional. Apresenta a influência da atividade balseira no desenvolvimento econômico dos municípios envolvidos, bem como a importância desta atividade no processo de povoamento da região oeste catarinense e norte rio-grandense. Às fontes orais que fizeram parte desse processo, bibliografias e material de acervo disponíveis, magistralmente reunidos numa obra da professora Noeli Woloszyn, acrescenta-se a estória de gentes imaginárias e vivências não tanto.

Os fatos, datas e nomes citados na primeira parte de cada capítulo foram extraídos do estudo “TRABALHADORES DO RIO - OS BALSEIROS DO RIO URUGUAI” da professora Noeli, a quem envidei esforços para contatar, sem sucesso. Todos os méritos devem ser a ela creditados.

A estória que se mescla, é fruto da imaginação do autor.

(Noeli Woloszyn, Licenciada em História e Mestranda em História pela UPF. É professora na Universidade do Contestado – UnC campus Concórdia/SC.)


____________________________





Capitulo I – O Prático Fulgêncio


Ficaria na cama, naquela manhã, apesar dos gritos da mulher. Elvira estava ficando cada vez mais irascível. Conservava traços da beleza antiga. As ancas largas, os seios fartos, descaídos, mas ainda bonitos, os olhos grandes, brilhosos. Os cabelos ainda eram longos e negros. Lisos, como os cabelos de todas as mulheres da sua tribo Kaingang.
O humor dela foi o que mudou, também por culpa dele, por certo.
- Acorda, velho bêbado. Olha a altura do sol. Já faz tempo que o Tiço ta lá na faixa – gritou ela enquanto passava pela porta carregando uma grande trouxa de roupas enroladas num lençol azul. Deve ter arrumado um novo freguês, pensou. O lençol não era conhecido e parecia estar limpo, sem precisão de ir para a tábua. Um freguês rico. Só podia. Ricos é que mandam lavar roupas só por estarem um pouco amassadas e usadas uma só vez. Tanto melhor para Elvira. Não precisaria de muito sabão nem de muito bater com pau.
A cabeça dele latejava. Sentia um ardume no estômago e gosto azedo na saliva. Bebera muita cachaça na noite anterior no bar do Moura. Tardara, mais que de costume. E na cama, sozinho, pois Elvira há tempos mudara-se para o quarto do filho mais velho, que fora embora para a cidade, entre náuseas e tosses engasgadas, vinha-lhe na lembrança enevoada a conversa que Moura tivera com os baianos.
Estava ele, Natalício, o filho mais velho do Céza, e mais alguns fregueses de pouca freqüência, mas conhecidos, bebericando no balcão do Moura, quando eles chegaram.
Eram três. Baixotes, entroncados, morenos, de fala arrastada e sotaque esquisito. Pediram cachaça, num copo só que Moura serviu gelada. Um deles bebericou e cuspiu fora... Moura olhou feio; os outros, que estavam já antes no balcão ficaram em silêncio. Os baianos confabularam entre eles e pediram mais três copos de cachaça, mas que não fosse gelada. Moura serviu a contragosto da garrafa da prateleira. Pegaram dos copos e foram sentar-se a uma mesa de latão. Não se entendia o que falavam. Beberam logo a cachaça e um deles pediu mais uma. Moura novamente serviu, mas desta vez com menor má vontade, pois o que pedira a segunda pinga tirou do bolso o dinheiro e pagou as cinco, contando com a que fora cuspida fora. Moura puxou conversa, e ainda sem voltar para trás do balcão, encheu os outros dois copos.
Fulgêncio ouvira parte da conversa, sem muito entender. Eram baianos, mesmo, compreendeu dizerem.
Tomaram mais uma ou duas pingas e foram embora. Pagaram.
Quando os três baianos saíram, e nem haviam ainda sumido por detrás do pilar da ponte, Moura se viu rodeado pelos freqüentadores.
- Quem eram eles, Moura?...
- Baianos.
- Baianos? Mas a Bahia é longe e eles estavam “de a pé”...
- Vieram no caminhão. Vão trabalhar na barragem.
A Barragem! Há tempo se falava na Barragem. A ameaça da barragem só estivera tão materializada há mais de ano, quando estiveram no Goio-En os tais de engenheiros, pescrutando as margens do rio com binóculos e um foco, que armaram em cima da ponte. Falou-se deles por uns dias, depois caiu no esquecimento. Era projeto, estudo.
Agora era real. Já estavam chegando baianos para entupir o rio, e inundar tudo.
Fulgêncio e Natalício trocara um olhar e baixaram ambos, as cabeças. Ali, dos reunidos no bar do Moura, eram eles os únicos balseiros ainda vivos.
Ficaram a um canto, sentados perto da porta a olhar o rio. A noite chegara. Ora Natalício, ora Fulgêncio se aproximavam do balcão. Levava os dois copos, que Moura enchia. Ora um, ora outro voltava a sentar-se perto da porta e olhar a sombra cintilante do rio, em silêncio.
Essas lembranças somadas ao exagero da cachaça fizeram a noite de Fulgêncio ser uma noite de sonos pela metade. E mesmo essa metade de sono não era bem dormida. Misturavam-se em sonhos a imagem dos três baianos troncudos, o rio revolto nas enchentes de São Miguel, os balseiros companheiros que o acompanharam em tantas e tantas descidas, o rio subindo e logo baixando até sumir mostrando o leito seco cheio de ossos e esqueletos todos com a cara do Vicente... que ria e ria debochado... A fumaça dos casebres do lado de Santo Tomé. As chinas “francesas” vindas das colônias italianas da serra das Antas ou as polacas grandonas que diziam terem sido artistas nas europas, mas falavam português misturado com castelhano. O Salto Grande-Yucumã.

Elvira passou pela porta novamente, olhou para dentro, mas desta vez não ralhou. Decidiu levantar. Doía-lhe o corpo e a alma. Tonteou ao sentar-se na cama. Com esforço caminhou até a porta dos fundos, passando pela cozinha, onde Elvira lidava com um peixe na pia. Seus olhos estavam fundos e vermelhos no espelho. Lavou o rosto na bacia. Os olhos continuavam vermelhos no espelho. Tomou um gole de água na concha da mão. Ainda com o rosto molhado seguiu para o morro onde, na pequena roça, o feijão minguava no meio do inço. Olhou desolado o cinza das folhas murchas e seguiu para o rio, para revisar as esperas. Numa delas havia um jundiá, dos médios, noutra um dos espinhentos que só serviria para o pirão. As demais estavam com a fisga nua. Recolheu os peixes e rearmou as esperas mecanicamente. Seu pensamento estava longe. Pensava no rio e nas balsas. Nos balseiros e nas descidas. No prático Fulgêncio que fora, no companheiro Natalício, nos remadores, no cozinheiro Florão, no Vicente que sumiu nas águas do Salto Grande, nas sedas que trazia para Elvira, nas histórias que contava aumentadas, para o Tiço quando ele era pequeno, no rio que seria irremediavelmente entupido pelos baianos da barragem, logo abaixo, em São Carlos.


Uma idéia começou a tomar forma em sua cabeça. Primeiro vaga e parecida com os pesadelos da noite mal dormida, enevoada, depois absurda e impraticável. Logo em seguida possível. Logo uma meta, um projeto. Desceria o rio novamente numa balsa antes que a barragem fechasse o rio para sempre. Falaria com Natalício, reuniria os remadores ainda vivos. Encontraria Florão, que, sabia, morava em Palmas no Paraná. Alguns dos filhos do Céza poderiam substituir os remadores já mortos e aqueles vivos que tinham mudado de vida...

Quem visse Fulgêncio voltando para a casinha no Goio-Em, caminhando pela margem do rio, quase a correr carregando numa vara um jundiá médio e um espinhento pequeno, estranharia. Os mais velhos talvez revivessem a imagem de um Fulgêncio prático balseiro, os mais novos imaginariam que o velho bêbado enlouquecera.

____________________________________________________






O HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA
PROJETO “ESTÍMULO À LEITURA”


CONSIDERAÇÕES NATALINAS


Algumas pessoas me perguntam se gosto de Natal.
Então, penso... O que é Natal para mim?
Grande dúvida? Imaginem...
Natal para mim é o PROJETO “ESTÍMULO À LEITURA”.
Principalmente porque ele não acontece apenas na época Natalina...
Obviamente dirão que eu deveria festejar o nascimento de Cristo e que nesta época precisamos nos sensibilizar com a pobreza do próximo, oferecer um peru de Natal a outros, dar um presentinho acolá... Mas e os outros dias do ano? Não são Natais?
Não pensem que eu não curto fazer compras... Presentear amigos ocultos e presenciais, familiares, colegas, o vizinho bom, o lixeiro, jardineiro...
Eu apenas questiono o lado comercial tão desesperado dos comerciantes somadas as necessidades de muitos que gastam seu décimo terceiro em presentes para dar alegria as crianças ou reunir a família (tomara que sua família seja diferente, que vivam em harmonia a ceia de Natal, sem brigas e inquisições). Não sei de vocês, mas meu décimo terceiro já está reservado para janeiro.. Impostos e seguros, etc, etc.. Pessimista? Nada disso, estou otimista, e feliz, afinal pretendo entrar no ano próximo sem saldo negativo no banco...
Como vou comemorar meu Natal?
Durante o ano todo eu celebro esperanças através das leituras. Costumo dizer que meu trabalho é igual à de uma formiguinha. de passo em passo carrego um livrinho aqui, outro ali...
Neste ano então! Tive ajuda de pessoas maravilhosas, escritores, editoras, amigos. Garanto que eles também se sentem gratificados, afinal Natal é solidariedade, doação, fé, esperança, união, contribuição, projetos, idéias,
trabalho, ação conjunta,cidadania,ética,valores,virtudes...
Perdoem-me quando sou reticente a festas, ver a parada Natalina,luzes na cidade piscando.Para quem curte: Feliz Natal!
Mas se você quiser participar do meu Natal, doe um livrinho para Oficina.
Durante o ano todo você será lembrado por mim, e por todas as crianças que receberão esse presente, abraçado infinitamente não somente na noite do nascimento de Cristo.
Colocarei a seguir uma listinha de sugestões.
E antes que me esqueça vou dizer algumas palavrinhas mágicas:
Gratíssima pela sua participação!




_______________________________________

EDITORA FUNDAMENTOS

Coleção Destemida - autora: Natalie J. Prior - cada exemplar: 24,80

Coleção Pérola - autora: Wendy Harmer - cada exemplar: 19,60

Coleção Go Firl - autores: vários - cada exemplar: 19,60

Coleção Poderosa - autorS Sérgio Klen - cada exemplar: 28,60

Coleção Goosebumps - cada exemplar: 24,80

Coleção O Segredo das Fadas, a partir do n. 4 - cada exemplar: 24,80

Coleção Moranguinho - cada exemplar: 14,90

Coleção Polly - cada exemplar: 19,60

Escola das Estrelas - cada exemplar: 23,80

Coleção Querido Diário Otário - cada exemplar: 19,60

____________________________________________________

domingo, 7 de dezembro de 2008

A Invenção do Amor


Em todas as esquinas da cidade, nas paredes dos bares, à porta dos edifícios públicos, nas janelas dos autocarros, mesmo naquele muro arruinado por entre anúncios de aparelhos de rádio e detergentes, na vitrine da pequena loja onde não entra ninguém, no átrio da estação de caminhos de ferro que foi o lar da nossa esperança de fuga, um cartaz denuncia o nosso amor.

Em letras enormes do tamanho do medo, da solidão, da angústia, um cartaz denuncia que um homem e uma mulher se encontraram num bar de hotel numa tarde de chuva entre zunidos de conversa e inventaram o amor com caracter de urgência, deixando cair dos ombros o fardo incómodo da monotonia quotidiana.
Um homem e uma mulher que tinham olhos e coração e fome de ternura e souberam entender-se sem palavras inúteis.


Apenas o silêncio. A descoberta. A estranheza de um sorriso natural e inesperado. Não saíram de mãos dadas para a humidade diurna. Despediram-se e cada um tomou um rumo diferente, embora subterraneamente unidos pela invenção conjunta de um amor subitamente imperativo.
Um homem e uma mulher, um cartaz denuncia colado em todas as esquinas da cidade. A rádio já falou. A TV anuncia iminente a captura. A policia de costumes, avisada, procura os dois amantes nos becos e nas avenidas.


Onde houver uma flor rubra e essencial é possível que se escondam, tremendo a cada batida na porta fechada para o mundo.

É preciso encontrá-los antes que seja tarde. Antes que o exemplo frutifique. Antes que a invenção do amor se processe em cadeia. Há pesadas sanções para os que auxiliarem os fugitivos. Chamem as tropas aquarteladas na província. Convoquem os reservistas, os bombeiros, os elementos da defesa passiva!...

Todos, decrete-se a lei marcial com todas as consequências. O perigo justifica-o!...

Um homem e uma mulher conheceram-se, amaram-se, perderam-se no labirinto da cidade;

É indispensável encontrá-los, dominá-los, convencê-los, antes que seja tarde e a memória da infância nos jardins escondidos acorde a tolerância no coração das pessoas.

Fechem as escolas! Sobretudo protejam as crianças da contaminação. Uma agência comunica que algures ao sul do rio, um menino pediu uma rosa vermelha e chorou nervosamente porque lha recusaram. Segundo o director da sua escola é um pequeno triste inexplicavelmente, dado aos longos silêncios e aos choros sem razão. Aplicado no entanto. Respeitador da disciplina. Um caso típico de inadaptação congénita, disseram os psicólogos.

Ainda bem que se revelou a tempo! Vai ser internado e submetido a um tratamento especial de recuperação. Mas é possível que haja outros. É absolutamente vital que o diagnóstico se faça no período primário da doença. E também que se evite o contágio com o homem e a mulher de que fala no cartaz colado em todas as esquinas da cidade. Está em jogo o destino da civilização que construímos, o destino das máquinas, das bombas de hidrogénio, das normas de discriminação racial, o futuro da estrutura industrial de que nos orgulhamos, a verdade incontroversa das declarações políticas...

É possível que cantem, mas defendam-se de entender a sua voz. Alguém que os escutou deixou cair as armas e mergulhou nas mãos o rosto banhado de lágrimas. E quando foi interrogado em Tribunal de Guerra, respondeu que a voz e as palavras o faziam feliz, lhe lembravam a infância. Campos verdes floridos. Água simples correndo. A brisa das montanhas.

Foi condenado à morte, é evidente. É preciso evitar um mal maior. Mas caminhou cantando para o muro da execução; foi necessário amordaçá-lo e mesmo desprendia-se dele um misterioso halo de uma felicidade incorrupta...

Procurem a mulher e o homem que num bar de hotel se encontraram numa tarde de chuva. Se tanto for preciso estabeleçam barricadas, senhas, salvo-condutos, horas de recolher, censura prévia à Imprensa, tribunais de excepção.

Para bem da cidade, do país, da cultura, é preciso encontrar o casal fugitivo que inventou o amor com carácter de urgência...

Os jornais da manhã publicam a notíciade que os viram passar de mãos dadas sorrindo numa rua serena, debruada de acácias. Um velho sem família, a testemunha, diz ter sentido de súbito uma estranha paz interior, uma voz desprendendo um cheiro a primavera, o doce bafo quente da adolescência longínqua.

-0-


Daniel Filipe, Poeta esquecido em Cabo Verde


Em 1925 nasceu Daniel Damásio Ascensão Filipe na ilha da Boavista, em Cabo Verde. Ainda criança, foi para Portugal onde fez os estudos liceais. Poeta, foi colaborador nas revistas Seara Nova e Távola Redonda, entre outras publicações literárias. Combateu a ditadura salazarista, sendo perseguido e torturado pela PIDE.
Num curto espaço de tempo, a sua poesia evoluiu desde a temática africana aos valores neo-realistas e a um intimismo original que versa o indivíduo e a cidade, o amor e a solidão.

Faleceu em 1964 em Cabo Verde.

Este poema/crônica é dele. Foi publicado no blog da Nova Águia

http://novaaguia.blogspot.com pela direção da revista e do Movimento Internacional Lusófono Paulo Borges, Celeste Natário e Renato Epifânio.
A grafia original lusa/cabo-verdiana foi mantida.

-0-

A segunda edição da Revista Nova Águia já está a circular. Ela é publicada pela Editora Zéfiro. http://www.zefiro.pt/catalogo_novaaguia_net.htm

Tem muito mais coisas boas lá.










-0-


O MIL: MOVIMENTO INTERNACIONAL LUSÓFONO é um movimento cultural e cívico recentemente criado, em associação com a NOVA ÁGUIA: REVISTA DE CULTURA PARA O SÉCULO XXI, projeto que conta já com mais de sete centenas de adesões, de todos os países lusófonos.
A Comissão Coordenadora do MIL é presidida pelo Professor Doutor Paulo Borges (Universidade de Lisboa), Presidente da Associação Agostinho da Silva (sede do MIL).
A lista de adesões é pública – como se pode confirmar publicamente (http://www.novaaguia.blogspot.com/), são pessoas das mais diversas orientações políticas e religiosas.
Caso se reconheça na nossa Declaração de Princípios e Objectivos (http://movimentolusofono.wordpress.com/declaracao-de-principios-e-objectivos/), pode juntar-se a nós. Para tal, basta enviar um e-mail para http://afmail.uol.com.br/compose?to=adesao@movimentolusofono.org (indique a área de residência).


__________________________________________


O HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA

“Estimular a leitura por meio do gozo literário, quer dizer, por ela mesma.” José Rufino Santos- Nova Escola 04/08

LEVANDO UMA HISTÓRIA PARA CASA


Para que chegassem aos livros da biblioteca, comecei a emprestar-lhes pequenas doses de histórias.
Recortei algumas de livros didáticos usados, fotocopiei contos de revistas infantis e pedagógicas.
Gradativamente os alunos estavam acostumando-se a ler em casa. Fui comprando revistas em quadrinhos e livrinhos, observando qual a preferência deles. Com o passar do tempo, a procura foi aumentando, comecei, então, a solicitar ajuda da família, amigos e editoras.

Para que adquiram o hábito da leitura é conveniente que comecem com leituras mais lúdicas, fantasiosas, da geração deles.
As clássicas, eles lerão quando este hábito estiver mais apurado.

De nada adianta forçar-lhes a ler Dom Casmurro sem antes não folhearem uma revistinha do Bem 10!

Portanto o acervo da Oficina é essencialmente “moderno”.

Desde revistinhas da Turma da Mônica, Super Homem, até livros para adolescentes, cujo tema principal é o amor.

Existem nas bancas, revistinhas de pensamentos de amor, poesias e frases que as meninas adoram até copiar em seus cadernos.

Até os meninos aproveitam as poesias para enviar cartinhas para as meninas...

Outro sucesso: livros de namoros, dicas e histórias de amor.

Com isto, tenho pesquisado livros deste gênero, pois acredito que lendo acontecimentos próximos de sua realidade, eles estarão no caminho certo para serem grandes leitores mais tarde.

Os sites de revistas teen na internet ajudam bastante. Eu costumo imprimir matérias, contos, histórias, curiosidades, (não imaginam meu consumo de tinta e papel...)

Gostaria até de indicar a revista Atrevidinha para as meninas de 12 anos. Uma graça de revista! Muito bem elaborada.

E outra dica, não é uma revista cara... Existem outras excelentes, como a Recreio, porém seu preço não é nada animador.

Com a rotina dos empréstimos precisei criar algumas normas para não perder o acervo. Alguns alunos não cuidam direito,amassam , rasgam e até perdem.

Vindo ao encontro, o resgate à responsabilidade, o cuidado ao transportar e manusear livros, revistas juntamente com o compromisso de devolver no tempo estabelecido. A pena máxima é quando o aluno fica “impedido” de levar mais histórias para casa.

Se ele levou uma vez e infringiu o estabelecido com relação ao prazo de entrega ou cuidado no manuseio, ele terá mais uma chance. Caso perca uma revista, deverá trazer outra. No início aceitava outras revistas similares. Mas, precisei exigir outra igual, pois acontecia do “cliente” gostar tanto daquelas revistas, que “perdiam”, sabe? Tipo: “Vou ficar com estas e levo outras para Oficina”...

Isto também é uma questão de observação, creiam, ainda existem crianças sem má fé. Simplesmente gostam do “Homem Aranha” e querem ficar com aquele exemplar...

Naturalmente algumas revistas foram “encontradas” em baixo da cama ou em gavetas misteriosas que a mamãe guardou e não avisou... Acontecia muito com as revistas de poesias, frases de amor e heróis.

Além do acervo de periódicos, Oficina tem livros infanto- juvenis.

Procuro sites de autores, assim, como comentei na primeira postagem, onde fiz os agradecimentos de doações.

Ainda queria muito que a autora Inês Stanisiere e/ou a Editora Planeta atendessem meu pedido. Os livros dela são tão lidos , que precisei encaderná-los, não com as capas duras, porque ficam muito caros... Se eles me doassem um exemplar de cada...

Ah! Não sabem como as meninas ficariam felizes. E ainda tem o lançamento novo...Não pude comprar ainda, e infelizmente não recebo retorno dos emails.
Drica Pinotti, outra escritora fantástica. Seus livros “Cinco Coisas” de relacionamento ou amizade , De Menina A Mulher, entre outros, são bem adequados, as meninas se divertem e ao mesmo tempo se informam.

Enfim, são tantas as propostas de leituras variadas com textos que fazem sentido a estes alunos.
Seria imperdoável que eu, como educadora, não os levassem a adquirir o HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA.

__________________________________________________________________

domingo, 30 de novembro de 2008

Enchentes

Amanhã eu vou m'embora
pros rumo de Uruguaiana
vou levando na minha balsa
cedro, angico e canjerana.

Quando chegar em São Borja,
dou um pulo a Santo Tomé
só pra ver as correntinas
e bailar um chamamé.

Oba, viva veio a enchente
o Uruguai transbordou
vai dar serviço prá gente.
Vou soltar minha balsa no rio,
vou rever maravilhas
que ninguém descobriu.

Se chegar ao Salto Grande
me despeço deste mundo,
rezo a Deus e a São Miguel e
solto a balsa lá no fundo.

Quem se escapa deste golpe,
chega salvo na Argentina.
Só duvido que se escape do
olhar das correntinas.

Oba, viva veio a enchente
o Uruguai transbordou
vai dar serviço prá gente.
Vou soltar minha balsa no rio,
vou rever maravilhas
que ninguém descobriu.

Composição de Barbosa Lessa, gravada por Cenair Maicá, e outros.

-0-

O que era esperado, antigamente, como uma bênção pelos balseiros do rio Uruguai, que transportavam madeiras através do rio para a Argentina e o Uruguai ( o País), a enchente, veio em forma de tragédia mais ao norte e ao leste de Santa Catarina. Seria um despropósito e extemporâneo iniciarmos a publicação de nossa história neste momento.

Além de que não nos será possível relatar da forma como gostaríamos, citando nomes e fatos reais. Essa História está pronta, mas amordaçada por circunstâncias várias. Se não podemos contar a História, contaremos a Estória. Será uma ficção, romanceada e novelesca, e estamos a dar esse novo formato. Não nos esqueceremos de colocar em destaque a famosa frase: “ Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com fatos, pessoas, situações passadas, presentes ou futuras terá sido mera coincidência”.

Nos aguardem.

Quasímodo e Juca Melena.
_____________________________


Há cerca de um mês, noticia-se de forma crescente nos meios de comunicação do Brasil e do exterior o que se passa no estado de Santa Catarina.

A grande enchente que se abate sobre o nordeste do estado, já é considerada a maior catástrofe natural de todos os tempos. São milhares de desabrigados e mais de uma centena de mortos, a maioria vítimas de deslizamentos de terras, que soterram suas residências. Não são, na sua quase totalidade, moradas improvisadas ou rústicas. São cidadãos que moravam em casas regulares, construídas ao abrigo da Lei e com autorização e habite-se oficial.

As chuvas não têm sido o que se pode considerar temporais, porém a constância e permanência delas, foi aos poucos se inflitrando na terra instabilizando-a nos morros, que já não têm a cobertura vegetal necessária para sustentá-la e enchendo os rios, que sem escoamento necessário, fugiu de seu leito natural e invadiu ruas e casas.

Neste momento é hora de solidariedade e ajuda.

Mas é preciso, desde já, começar a elaborar uma pauta de discussões. Não foi só a natureza a culpada. Chuvas sempre houveram, de maior ou menor intensidade. É preciso responsabilizar, individual ou coletivamente, quem permitiu a ocupação e destruição de espaços necessarios à preservação do equilíbrio e harmonia da gealogia antes existente.

É preciso rediscutir planos diretores, leis de ocupação de solo e o papel das imobiliárias e incorporadoras e de quem lhes autoriza a comercializar áreas que deveriam ser preservadas para o bem comum.
Por ora é só. Mas só por ora.
________________________________


O HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA

“Literatura é um prazer que pode ser estimulado, e não prescrito.”
José Rufino Santos – Nova Escola – 04/08



O tema do último concurso deste semestre foi baseado nas leituras que fizemos durante os meses de outubro e novembro.

Os alunos escreveram sobre suas aventuras, ou sobre seu herói preferido. O prêmio foi uma caixa de chocolates, sugestão dada por eles, na última pesquisa, realizada em novembro.

Eis a redação vencedora: Mariana – 6º Ano 11


MEU HERÓI PREFERIDO


Meu herói preferido é Deus, porque Ele nunca nos deixa sentir humilhados e nem ofendidos quanto aos vilões, e sempre nos coloca para frente, erguendo-nos a cabeça para o bem.

E o amor? Isso sim é ser herói!

Um herói que todos nós podemos ter, e que nunca será morto ou atacado por um vilão. Pois sempre estará guardado em nossos corações. “Ele tudo pode” e não há vilão que possa descobrir Sua façanha, então me fale:

- Quem vai desmascarar um amor verdadeiro de Pai?

Além de querido é um herói incrível, pois faz vários milagres por todo o mundo, como curar os olhos de um cego e talvez até as chagas de um homem. Creio que nenhum super herói como os de hoje possa fazer isso. Ele é incrível e inevitável na hora de realizar Seus milagres.

Então me diga: - Quem O pode? Ninguém!

Quem O vence? Ninguém!

Quem O derrota ? Ninguém!

Quem O deixa pra baixo? Ninguém!

E quem O ama? Todos!

È difícil resistir a tanto amor e carinho, pois Ele, o Deus, super herói, nos dá a confiança de um novo amanhecer com mais fé e amor, por Ele e pela vida.

Só que tanto amor assim está passando despercebido nas vidas dos jovens e das crianças. A televisão está tomando conta da vida deles. Então, vamos honrar a Deus e ser seus seguidores, pois Ele é o mandante, o Criador e o começo de tudo. E se Deus é um super herói e nós somos filhos deles, só podemos ser também super heróis.Mas não desses que podem voar ou até subir em paredes, e sim, pregadores de amor e paz.

Finalmente, assim, estaríamos cumprindo nossa missão aqui na terra.

Devo então, a Ele, meu muito obrigado, por ter me protegido todo esse tempo e me guiado para o caminho certo.
-0-
As sementes existem e são férteis.
Quando alguém ajuda a criar as condições, elas brotam e crescem.
Um novo blog foi criado recentemente, e já, pelo seu título, diz a que veio.
"Projetos e Idéias"
Vale acessar.
____________________________________________












domingo, 23 de novembro de 2008

O Boi Velho e o Hábito Saudável da Leitura



Quasímodo e Juca pretendiam, nesta edição, publicar a quatro mãos e a título de apreciação, uma história numa série de três ou quatro capítulos, sobre os balseiros do rio Uruguai.

Seria um teste da aceitação (ou não) desse formato, antes de lançarem-se a uma empreitada maior, que já está em adiantada fase, sobre as Reduções Jesuíticas.

Alguns problemas de ordem legal os impediram, temporariamente. Coisas a ver com direitos autorais e de pessoas, ainda vivas, de quem são necessários ter os seus consentimentos para citá-las e os seus testemunhos. Esperam eles superar esses pequenos entraves em breve, tudo de forma a passar as informações o mais próximo possível da verdade histórica, sem prejudicar pessoas ou ferir a Lei.

A partir desta edição, a Torre dará forma visual a uma pessoa que tem colaborado semanalmente e convergente com o cariz do blog. Trata-se de “Krika – A Professora” que juntamente com Juca Melena frequentará livremente os corredores da Torre e as pautas das Letras. Sua imagem-marca aparecerá sempre que o assunto se refira à educação.

Boa leitura.
_____________________________


O BOI VELHO


Cuê-pucha!… é bicho mau, o homem!

Conte vancê as maldades que nós fazemos e diga se não é mesmo!... Olhe, nunca me esqueço dum caso que vi e que me ficou cá na lembrança, e ficará té eu morrer… como unheiro em lombo de matungo de mulher.

Foi na estância dos Lagoões, duma gente Silva, uns Silvas mui políticos, sempre metidos em eleições e enredos de qualificações de votantes.

A estância era como aqui e o arroio como a umas dez quadras; lá era o banho da família. Fazia uma ponta, tinha um sarandizal e logo era uma volta forte, como uma meia-lua, onde as areias se amontoavam formando um baixo: o perau era do lado de lá. O mato aí parecia plantado de propósito: era quase que pura guabiroba e pitanga, araçá e guabiju; no tempo, o chão coalhava-se de fruta: era um regalo!

Já vê... o banheiro não era longe, podia-se bem ir lá de a pé, mas a família ia sempre de carretão, puxado a bois, uma junta, mui mansos, governados de regeira por uma das senhoras-donas e tocados com uma rama por qualquer das crianças.Eram dois pais da paciência, os dois bois. Um se chamava Dourado, era baio; o outro, Cabiúna, era preto, com a orelha do lado de laçar, branca, e uma risca na papada.

Estavam tão mestres naquele piquete, que, quando a família, de manhãzita, depois da jacuba de leite, pegava a aprontar-se, que a criançada pulava para o terreiro ainda mastigando um naco de pão e as crioulas apareciam com as toalhas e por fim as senhoras-donas, quando se gritava pelo carretão, já os bois, havia muito tempo que estavam encostados no cabeçalho, remoendo muito sossegados, esperando que qualquer peão os ajoujasse.

Assim correram os anos, sempre nesse mesmo serviço.

Quando entrava o inverno eles eram soltos para o campo, e ganhavam num rincão mui abrigado, que havia por detrás das casas. Às vezes, um que outro dia de sol mais quente, eles apareciam ali por perto, como indagando se havia calor bastante para a gente banhar-se. E mal que os miúdos davam com eles, saíam a correr e a gritar, numa algazarra de festa para os bichos.

- Olha o Dourado! Olha o Cabiúna! Oôch!... oôch!…

E algum daqueles traquinas sempre desencovava uma espiga de milho, um pedaço de abóbora, que os bois tomavam, arreganhando a beiçola lustrosa de baba, e punham-se a mascar, mui pachorrentos, ali à vista da gurizada risonha.Pois veja vancê... Com o andar do tempo aquelas crianças se tornaram moças e homens feitos, foram-se casando e tendo família, e como quera, pode-se dizer que houve sempre senhoras-donas e gente miúda para os bois velhos levarem ao banho do arroio, no carretão.

Um dia, no fim do verão, o Dourado amanheceu morto, mui inchado e duro: tinha sido picado de cobra.Ficou pois solito, o Cabiúna; como era mui companheiro do outro, ali por perto dele andou uns dias pastando, deitando-se, remoendo. Às vezes esticava a cabeça para o morto e soltava um mugido... Cá pra mim o boi velho - uê! tinha caraca grossa nas aspas! - o boi velho berrava de saudades do companheiro e chamava-o, como no outro tempo, para pastarem juntos, para beberem juntos, para juntos puxarem o carretão...

- Que vancê pensa!… os animais se entendem... eles trocam língua!...

Quando o Cabiúna se chegava mui perto do outro e farejava o cheiro mim, os urubus abriam-se, num trotão, lambuzados de sangue podre, às vezes meio engasgados, vomitando pedaços de carniça...

Bichos malditos, estes encarvoados!...

Pois, como ficou solito o Cabiúna, tiveram que ver outra junta para o carretão e o boi velho por ali foi ficando. Porém começou a emagrecer... e tal e qual como uma pessoa penarosa, que gosta de estar sozinha, assim o carreteiro ganhou o mato, quem sabe, de penaroso. também...

Um dia de sol quente ele apareceu no terreiro.

Foi um alvoroto da miuçalha.

- Olha o Cabiúna! O Cabiúna! Oôch! Cabiúna! oôch!...

E vieram à porta as senhoras-donas, já casadas e mães de filhos, e que quando eram crianças tantas vezes foram levadas pelo Cabiúna; vieram os moços, já homens, e todos disseram:

- Olha o Cabiúna! Oôch! Oôch!...

Então, um notou a magreza do boi; outro achou que sim; outro disse que ele não agüentava o primeiro minuano de maio; e conversa vai, conversa vem, o primeiro, que era mui golpeado, achou que era melhor matar-se aquele boi, que tinha caraca grossa nas aspas, que não engordava mais e que iria morrer atolado no fundo dalguma sanga e... lá se ia então um prejuízo certo, no couro perdido...

E já gritaram a um peão, que trouxesse o laço; e veio. A mão no mais o sujeito passou uma volta de meia-cara; o boi cabresteou, como um cachorro...

Pertinho estava o carretão, antigão, já meio desconjuntado, com o cabeçalho no ar, descansando sobre o muchacho.

O peão puxou da faca e dum golpe enterrou-a até o cabo, no sangradouro do boi manso; quando retirou a mão, já veio nela a golfada espumenta do sangue do coração...

.Houve um silenciozito em toda aquela gente.

O boi velho sentindo-se ferido, doendo o talho, quem sabe se entendeu que aquilo seria um castigo, algum pregaço de picana, mal dado, por não estar ainda arrumado... - pois vancê creia! -: soprando o sangue em borbotões, já meio roncando na respiração, meio cambaleando o boi velho deu uns passos mais, encostou o corpo ao comprido no cabeçalho do carretão, e meteu a cabeça, certinho, no lugar da canga, entre os dois canzis... e ficou arrumado, esperando que o peão fechasse a brocha e lhe passasse a regeira na orelha branca...

E ajoelhou… e caiu… e morreu...

Os cuscos pegaram a lamber o sangue, por cima dos capins… um alçou a perna e verteu em cima... e enquanto o peão chairava a faca para carnear, um gurizinho, gordote, claro, de cabelos cacheados, que estava comendo uma munhata, chegou-se para o boi morto e meteu-lhe a fatia na boca, batia-lhe na aspa e dizia-lhe na sua língua de trapos:

- Tome, tabiúna! Nó té... Nô fá bila, tabiúna!...

E ria-se o inocente, para os grandes, que estavam por ali, calados, os diabos, cá pra mim, com remorsos por aquela judiaria com o boi velho, que os havia carregado a todos, tantas vezes, para a alegria do banho e das guabirobas, dos araçás, das pitangas, dos guabijus!…

- Veja vancê, que desgraçados; tão ricos… e por um mixe couro do boi velho!...

- Cuê-pucha!…é mesmo bicho mau, o homem!

Mais um conto de João Simões Lopes Neto extraído do livro Contos Gauchescos publicado em 1912.

_____________________________

O HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA

“...Estimular a leitura pelo prazer literário, ou seja, permitir que o aluno jogue, fabule, imagine, invente, desenhe, represente, cante. Tudo isso é da mesma natureza que o prazer pela leitura.”
Joel Rufino Santos - Nova Escola - 04/2008

RESENHAS

Como atividade de avaliação, a resenha apresenta-se de forma satisfatória e prazerosa, pois cumpre seu papel para ambos: professor e aluno.

Os alunos que levam um livro para ler em casa e que desejam ganhar um prêmio das promoções ou concursos entregam suas resenhas na Oficina.

Por ser uma atividade livre, como incentivo, e para que haja grande participação, eu ofereço brindes ou prêmios.

Os alunos pegam os cupons na caixinha, levam junto com o livro escolhido, preenchem após a leitura e aguardam o resultado.

Como introduzir a resenha:

Tenho dois modelos de resenhas. No início não falo que se trata de resenha, pois este termo ainda é desconhecido para eles.

Apresento modelos de resenhas como leituras e explico seu significado.

No início do ano eu coloco no cupom:
“Eu gostei da história que li porque, ou não gostei porque...”

Quando já estão cientes que se trata de “uma propaganda do livro lido”, eu coloco a palavra RESENHA no cupom, retirando a frase inicial.

Na medida em que se familiarizam com o exercício, aumento as dificuldades, exigindo uma produção do texto melhor, mais qualidade no vocabulário, mais capricho, afinal, estão “apreciando” uma obra lida e sugerindo sua leitura para colegas.


Promoções:

“Troque sua resenha por uma folha decorada.”
“Troque sua resenha por um material escolar.”
Após a correção das resenhas, eles escolhem a troca.

Concursos:

“Oficina dá prêmios para você.”
Realizados periodicamente, ofereço um prêmio, como dinossauros (revistas Recreio), chocolates, enfeites, cadernos decorados, canetas, etc.

Estes prêmios são doados por amigos, comprados em lojas de 1,99 ou ofertas que acompanham revistas, etc.

Estas resenhas são mais específicas, acompanhando o tema das leituras do mês. Ou seja, se o tema é aventura, lerão e farão as resenhas do tema.

Se um determinado material de leitura está sendo “esquecido”, eu faço alguma promoção dando prioridade para aquele material. As revistas Ciência Hoje é um exemplo.

Conhecem o ditado: “A propaganda é a alma do negócio?”

Pois é assim que funciona.

Bastou colocá-las em evidência, orientando-os através das leituras de como se lê um periódico, observando desde a capa, índice, assuntos, etc.

Livros didáticos trazem sugestões da prática destas leituras.

Reservo aulas para esta atividade. Eles aprendem individualmente a manusear as revistas.
Lembrem-se, meu trabalho é de “formiguinha”. Exige paciência e perseverança.

A Oficina oferece além de livros e revistas, leituras recortadas, fotocopiadas, retiradas da internet, de livros didáticos,revistas como Nova Escola, Recreio entre outras.

Uma nova experiência que fez sucesso entre as meninas foram os contos da escritora Thalita Rebouças. Ela escreve uma coluna na revista Atrevida. Acesso a revista pela internet e copio os contos. Aproveito também dicas de beleza, comportamento, moda.

O concurso “Fala Sério” revelou a criatividade das alunas.

A proposta era ler e fazer uma apreciação. O prêmio foi um kit bijuterias. Escolhi duas vencedoras, depois de, inclusive, solicitar ajuda a algumas colegas para o desempate, que não ocorreu, pois as duas corresponderam bem as expectativas. Conclusão: dividi o prêmio entre elas...

Produção de textos:

Alguns concursos são oferecidos para que escrevam livremente sobre um tema. Foi o que ocorreu no tema Folclore, no mês de agosto. O aluno vencedor, motivado pelas Olimpíadas, colocou o Saci no avião rumo á China. A proposta foi escrever uma história engraçada com este personagem.

No final desta postagem estão reproduzidas as produções destes vencedores.

Apresentação:

Como são curiosos, o painel é um momento excelente de estímulo. Existe uma satisfação de mostrarem suas resenhas, claro, além de ganharem um brinde ainda estão indicando aquelas leituras para os colegas.

Após a correção, escolho as mais significativas para colocar no painel.

Esta é uma oportunidade também para os alunos que apresentam dificuldades ao escrever e para os que lêem bem, que não gostam de escrever. Ofereço livros mais fáceis de interpretação. Oriento na elaboração, inclusive pedindo para passarem a limpo. Com o decorrer deste exercício, eles vão adquirindo confiança, gosto pela leitura, chegando aos livros mais adequados para sua idade.

Na medida em que eles me entregam outras, vou substituindo-as no painel, apresentando assim, novidades produzidas por eles.

____________________


VENCEDOR DO CONCURSO SACI

Miguel - 6º ANO 12 SACI NAS OLIMPÍADAS

Saci fez a maior bagunça no avião indo para a China.

Você deve estar perguntando:- O que o Saci está fazendo num avião?

Ele está indo para a China...

Você dever estar perguntando:- O que ele vai fazer na China?

Ele vai participar da Olimpíada.

Ele está meio indeciso em qual esporte vai participar. Pensando, ele disse:
- No boxe eu não quero, eu já estou com as duas mãos furadas, eu não quero voltar para o Brasil mais furado ainda... No hipismo também não vai dar certo. Os cavalos já conhecem minha fama de dar nó nas crinas...

Enquanto ele pensava, o piloto do avião cansado de suas badernas como: dar nó nos cabelos dos passageiros, fazer desaparecer suas malas e usar seu rodamoinho de vento para derrubar a água da privada do banheiro...

Então, ele resolveu jogar o Saci fora do avião pela janela.

Quando o Saci foi se tocar, já estava em cima do Ninho do Pássaro.

E foi aí, que ele decidiu participar do salto com vara.

E foi assim, que o Brasil ganhou ouro nas olimpíadas de 2008!
-0-

VENCEDORAS DO KIT BIJUTERIAS:
ALUNAS DO 6º ANO “ Fala Sério!!

Pãmela , da sala 12 ,escreveu :

Já vi que Malu não tem sorte mesmo, hem?

Um dia, pegar logo seis espinhas. Fala sério, né?

Mas, fazer o quê? Isso acontece com todo mundo.

Mas acho que Malu gostou de ter espinhas. Pelo menos ficou do lado do seu amor, conversando
sobre espinhas e nem viu passar a hora, dentro do ônibus...

Isso que é amor... De espinhas!

E é por isso que Malu fala:

VIVA AS ESPINHAS!

Patrícia Pires, da sala 11, escreveu:

Hi! Sujou! Nasceram muitas espinhas no rosto de Malu, que pediu muitas opiniões às amigas.

E coitada, levou tanto “você está feia!” na cara. Quem mandou pedir opiniões?

Malu ligou para Cecília marcando uma limpeza de pele, ficou com medo, mas o que ia fazer, né?

Passou muita dor, mas para ficar bonita o que a gente não faz?

Saiu de lá toda vermelha, mas para alegrar, ganhou um elogio, depois daquilo ela até esqueceu das espinhas!


_____________________________________________









sábado, 15 de novembro de 2008

A Lenda da Lagoa Vermelha e Outros Assuntos

A primeira tentativa dos padres jesuítas, que resultou na fundação de 18 Povos Missioneiros no Rio Grande do Sul, deu em nada. Os bandeirantes de Piratininga, que haviam arrasado as reduções do Guairá caçando e escravizando índios para a escravidão das lavouras de cana-de-açúcar de São Paulo e Rio de Janeiro, quando souberam que os padres tinham vindo mais para o sul e erguido suas aldeias no Tape, vieram aqui fazer o que sabiam fazer. Assim e aos poucos, os padres tiveram que refluir para o oeste, fazendo agora na volta o mesmo caminho que tinham feito na vinda.
E nessa fuga tratavam de levar consigo tudo o que podiam carregar. O que não podiam, queimavam ou enterravam. Casas, plantações, até igrejas foram incendiadas, para que nada ficasse ao emboaba agressor.
Pois dizem que numa dessas avançava pelo Planalto, no rumo da Serra, vinha uma carreta carregada de ouro e prata, fugindo das Missões. Ali vinha a alfaia das igrejas, candelabros, castiçais, moedas, ouro em pó, um verdadeiro tesouro cujo peso faziam os bois peludearem. Com a carreta, alguns índios e padres jesuítas e atrás deles, sedentos de sangue e ouro, os bandeirantes.
Ao chegarem às margens de uma lagoa, não puderam mais. Desuniram os bois e atiraram a carreta com toda a sua preciosa carga na lagoa, muito profunda. E então os padres mataram os índios carreteiros e atiraram os corpos n'água, para que não contassem a ninguém onde estava o tesouro. Com o sangue dos mortos, a lagoa ficou vermelha.

E lá está, até hoje. Ao seu redor, cresceu uma bela cidade, que tomou seu nome - Lagoa Vermelha. E cada um dos moradores que passa na beira das águas coloradas, lembra que ali ninguém se banha, nem pesca, e segundo a tradição, a lagoa não tem fundo. E nas secas mais fortes e nas chuvaradas mais brabas, o nível da lagoa é sempre o mesmo.





-0-



Eu e Juca estamos a desenvolver uma matéria sobre as Reduções Jesuíticas e os índios Guaranis, fundamental para o entendimento da História e Cultura Gaúcha. Como o tema é relativamente longo, estamos em busca da melhor forma de contar-vos, sem o risco de se tornar enfadonho e cansativo. Esperamos superar esse impasse em breve.


____________________



Buenas, compadre. Sarastes daquela lombeira de letras?... Sarastes?... Então... Quem te ajeitou as idéias foi a dotora Anne ou o meu compadre de Bagé?... Nenhum dos dois? Sarastes por conta?... Isso recai e recolhe, como caxumba. Melhor tomar tenência.

Já que falastes de padres, pois eu, como lhe disse, de reza decorei a Ave Maria até o bendito o fruto e o Pai Nosso até as ofensas. Mas sei, por ouvir contar, o causo das Escrituras. Bota aí!... Foi assim:

A história essa é meio comprida, mas vale a pena contá por causa dos revertério.

De Adão e Eva acho que não é perciso contá os causo, porque todo mundo sabe que os dois foram corrido do Paraíso por tomá banho pelado numa sanga.

Naqueles tempo, esse mundaréu todo era um pasto só sem dono, onde não tinha nem dele nem meu. O primeiro índio a botá cerca de arame farpado foi um tal de Abel.
Mas nem chegou a estendê o primêro fio porque levou um pontaço nos peito do irmão dele, um tal de Caim, que tava meio desconforme com a divisão.

O Caim, entonces, ameaçado de processo feio, se bandeou pro Uruguay. Deixou o filho dele, um tal de Noé, tomando conta da estância.

A estância essa ficava nas barranca de uma corredêra e o Noé, uns ano despois, pegou uma enchente muito feia pela frente. Côsa muito séria...

Caiu água uma barbaridade! Caiu tanta água que tinha até índio pescando jundiá em cima de cerro.

O Noé entonces botou as criação em cima de uma balsa e se largou nas correnteza, o índio velho.
A enchente era tão braba que quando o Noé se deu conta a balsa tava atolada num banhado chamado Delúvio. Foi aí que um tal de Moisés varou aquela água toda com vinte junta de boi e tirou a balsa do atolêro.

Bueno, aí com aquele desporpósito, as família ficaram amiga.

A filha mais velha do Noé se casou-se com o filho mais novo do Moisés e os dois foram morá numa estância muito linda, chamada estância da Babilônica.

Bueno, tavam as família ali, tomando mate no galpão, quando se chegou um correntino chamado Golias, com mais uns trinta castelhano do lado dele.

Abriram a cordeona e quiseram obrigá as prenda a dançá uma milonga. Foi quando os velho, que eram de muito respeito, se queimaram e deu-se o entrevêro.

Peleia braba, seu. O correntino Golias, na voz de vamos, já se foi e degolou de um talho só o Noé e o velho Moisés. E já tava largando planchaço em cima do mulherio quando um piazito carretêro, de seus dez ano e pico, chamado Davi, largou um bodocaço no meio da testa do infeliz que não teve nem graça. Foi me acudam e tou morto.

Aí a indiada toda se animou e degolaram os castelhano.

Dois que tinham desrespeitado as prenda foram degolado com o lado cego do facão. Foi uma sangüêra danada. Tanto que até hoje aquele capão é chamado de Mar Vermelho.

Mas entonces foi nomeado delegado um tal de major Salomão. Homem de cabelo nas venta, o major Salomão.

Nem les conto! Um dia o índio tava sesteando quando duas velha se baterem em cima dum guri de seus seis ano que tava vendendo pastel. O major Salomão, muito chegado ao piazito, passou a mão no facão e de um talho só cortou as velha em dois. Esse é o muito falado causo do Perjuízo de Salomão que contam por aí.

Mas, por essas estimativas, o major Salomão, o que tinha de brabo tinha de mulherengo. Eta índio bueno, seu. Onde boleava a perna, já deixava filho feito. E como vivia boleando a perna, teve filho que Deus nos livre. E tudo com a cara dele, que era pra não havê discordânça. Só que quando Deus Nosso Senhor quer, até égua véia nega estribo.

Logo a filha das predileção do major Salomão, a tal de Maria Madalena, fugiu da estância e foi sê china de bolicho. Uma vergonhêra pra família ! Mas ela puxou a mãe, que era uma paraguaia meio gaudéria que nunca tomô jeito na vida.

O pobre do major Salomão se matou-se de sentimento, com uma pistola Eclesiaste de dois cano.
Mas, vejam como é a vida. Pois essa mesma Maria Madalena se casou-se três ano despois com um tal de coronel Ponciano Pilatos. Foi ele que tirou ela da vida. Eu conheço uns três causo do mesmo feitio e nem um deles deu certo.

Como dizia muito bem o finado meu pai, mulher quando toma mate em muita bomba, nunca mais se acostuma com uma só. Mas nesses contraproducente, até que houve uma contrapartida.

O coronel Ponciano Pilatos e a Maria Madalena tiveram doze filho, os tal de apósto, que são muito conhecido pelas caridade que fizeram. Foi até na casa deles que Jesus Cristo churrasqueou com a cunhada de Maria Madalena, que despois foi santa muito afamada. A tal de Santa Ceia.

Pois era uns tempo muito mal definido. Andava uma seca braba pelos campo.

São José e a Virge Maria tinham perdido todo o gado e só tavam com uma mula branca no potrêro, chamada Samaritana. Um rico animal, criado em casa, que só faltava falá. Pois tiveram que se desfazê do pobre...

E como as desgraça quando vem, já vem de braço dado, foi bem aí que estouraram as revolução. Os maragato, chefiado por um tal de coronel Jordão, acamparam na entrada da Vila. Só não entraram porque tava lá um destacamento comandado pelo tenente Lázo, aquele mesmo que por duas vez foi dado por morto.

Mas aí um cabo dos provisório, um tal de cabo Judas, se passou-se pro maragato e já se veio uns tal de Romano, que tavam numas várzea, e ocuparam a Vila.

Nosso Senhor foi preso pra ser degolado por um preto muito forte e muito feio chamado Calvário.
Pois vejam como é a vida. Esse mesmo preto Calvário, degolador muito tal afamado, era filho da velha Palestina, que tinha sido cozinhêra da Virge Maria. Degolador é como cobra, desde pequeno já nasce ingrato.

Mas entonces botaram Nosso Senhor na cadeia, junto com dois abigeatário um tal de João Batista e o primo dele, Heródio dos Reis. Os dois tinham peleado por causo de uma baiana chamada Salomé e no entrevero balearam dois padre, monsenhor Caifás e o cônego Atanásio.

Mas aí veio uma força da Brigada, comandada pelo coronel Jesus Além que era meio parente do homem por parte de mãe e com ele veio mais três corpo de provisório e se pegaram com os maragato. Foi a peleia mais feia que se tem conhecimento. Foi quarenta dia e quarenta noite de bala e bala.

Morreu três santo na luta: São Lucas, São João e São Marco. São Mateus ficou três mês morre não morre, mas teve umas atenuante a favor e salvou-se, o índio...

Nosso Senhor pegou três balaço, um em cada mão e um que varou os pé de lado a lado. Ainda levou mais um pontaço do mais velho dos Romano, o César Romano, na altura das costela. Ferimento muito feio que Nosso Senhor curou tomando vinagre na sexta-feira da paixão...

Mas aí, Nosso Senhor se desiludiu-se dos home, subiu na Cruz, disse adeus pros amigo e se mandou-se de volta pro Céu.

Mas deixou os dez mandamento, que são cinco e que se pode muito bem acolherá em dois:

1º - Não se mata home pelas costa,

2º - Nem se cobiça mulher dos ôtro pela frente.

-0-




Este texto me foi enviado há mais de três anos pela querida amiga “Olhos” dizendo ser ele anônimo e que foi encontrado escrito a ponta de facão no balcão de um bolicho, hoje tapera, no Passo do Elesbão, Quinto Distrito de Cacequi, na Província de São Pedro do Rio Grande.



________________________





O HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA
CONSIDERAÇÕES INICIAIS



“O primeiro recurso pedagógico deve ser sempre o da sedução.” José Rufino dos Santos - Revista Nova Escola - 04/2008

“ESTIMULADA” pelo anfitrião deste blog, farei algumas considerações a respeito deste assunto: Leitura.

Pois bem, o que há de mais importante que adquirir bons hábitos nesta prática?

Professores das séries iniciais do Ensino Fundamental buscam nos livros didáticos de Língua Portuguesa, alternativas para ensinar a ler, interpretar e ao mesmo tempo passar o gosto pela leitura a seus alunos. Além da leitura, ainda precisam ensinar a gramática, ortografia e produção de textos. Tarefa complicada, pois não encontramos tudo num mesmo livro.
Para os professores que desejam um retorno satisfatório de suas turmas a alternativa é pesquisar em vários livros.

A Língua Portuguesa funciona como um “carro chefe”, ou seja, em todas as disciplinas o aluno terá que ler e interpretar.

Tem ocorrido nas escolas uma defasagem de aprendizagem. Os alunos chegam para o ano seguinte despreparados, hoje quase não existe reprovação (questões políticas). O mínimo que se pode exigir de um aluno é que leia correntemente e saiba o que leu, interpretando o texto.
Deveria ser assim, não?Mas, nossa realidade é bem outra...

Por que este projeto?
Porque falar, ouvir e escrever são essenciais em nossa relação com os outros e com o mundo. E a linguagem é a ferramenta cultural que utilizamos para esta inter – relação. Portanto, o projeto procura mergulhar nas diferentes formas de ver o mundo presente nos textos.

O “Estímulo À leitura” surgiu para dar um apoio às professoras regentes de Língua Portuguesa, na escola onde trabalho. Trata-se de uma escola pública, de 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental.
Recebemos estes alunos vindos da rede municipal, lá eles foram alfabetizados e seguiram até o 5º ano (antiga 4ª série).

Obviamente, as professoras com 35 alunos, em média, nas salas de aulas, não teriam oportunidades de avaliar a leitura individual de todos.

Como funciona?

Durante as aulas de Língua Portuguesa, chamo-os um a um, (na Oficina). Dou-lhes uma leitura pequena. Eles lêem em silêncio, depois lêem alto para eu ouvir e contam com suas palavras o que leram. Simples assim!

Sobre o que lêem? Eis a questão!

Faço um plano de ação envolvendo os assuntos mais pertinentes para esta faixa etária. Eles estão ainda na fase de contos de fadas. Começo por aí.

As leituras devem ser prazerosas, bem diferentes das convencionais dos livros didáticos, então jamais pegaria o livro adotado. O trabalho é todo oral, ou seja, não cobro a parte escrita neste momento.

Outro detalhe importante: o ambiente.

Quem não gosta de uma sala bem decorada? Este trabalho então é feito, numa pequena sala, que chamo de Oficina de Leitura. Lá a fantasia corre solta, juntamente com personagens de histórias em quadrinhos, de filmes, desenhos, etc... Tudo muito bem colorido e chamativo.
Cartazes de resenhas de livros também ficam expostos nas paredes para ajudar estes alunos a escolher um livro para ler em casa, (assunto para outra matéria).

Os temas são mudados mensalmente. Gradativamente vou aumentando o grau de dificuldades e interesses. Dentro do mesmo tema eu seleciono vários níveis de leituras, pois os alunos apresentam diferentes fases. Existem aqueles que lêem e interpretam, os que somente lêem e não interpretam e os que lêem com dificuldades, devido à falta de treino, mas que compreendem bem e interpretam satisfatoriamente, ou que não estão alfabetizados ainda.

Para cada um eu seleciono um tipo de leitura.

Conseqüentemente, eles estão sendo avaliados toda vez que lêem e interpretam.Registro tudo em meu caderno de avaliação. No final de cada mês apresento um gráfico com os resultados para as professoras das classes.

Com o passar do tempo, dias e meses, vocês nem imaginam o resultado!

O treino da leitura em voz alta possibilita também a desinibição. Eles estão sendo preparados para um teatro ou leitura em público.

Alguns acham tão fascinante, que treinam em casa, (sugestão minha, como estratégia), lendo para irmãozinhos menores (A Oficina empresta livros de histórias para irmãozinhos menores).
A forma lúdica para o treino e gosto pela leitura possibilita mais espontaneidade e até aqueles que não gostavam de ler passam a gostar, pelo menos de um gênero literário.

Gênero literário é algo em que o professor deve se preocupar.

Hoje em dia as editoras se esmeram em facilitar este aspecto, estratégia de venda, que, para nós, se transformam em estratégia didática.

Pesquisando na internet ou nos catálogos das editoras, você encontra as sugestões por gênero e faixa etária. Indispensável também são as resenhas, que dão uma noção básica sobre os livros.

A prática de fazer resenhas, também terá uma matéria específica.

Naturalmente as professoras de Língua Portuguesa e demais disciplinas notaram o desenvolvimento de seus alunos. Isto sempre é comentado em reuniões pedagógicas.

Neste mundo tão abrangente, busquei atividades diversas, solicitando também opiniões dos próprios alunos, através de pesquisas.

Existem várias alternativas para aguçar a curiosidade dos alunos e fazê-los ler brincando.

Afinal, nosso objetivo é prepará-los para ler o mundo!



Simplesmente ler
Prof .Edith C. Teodoro

Ler muito.
Ler “quase” tudo.
Ler com os olhos, os ouvidos, como tato, pelos poros e demais sentidos.
Ler com razão e sensibilidade.
Ler desejos, o tempo, o som do silêncio e do vento.
Ler imagens, paisagens, viagens.
Ler verdades e mentiras.
Ler para obter informações, inquietações, dor e prazer.
Ler o fracasso, o sucesso, o ilegível, o impensável, as entrelinhas.
Ler na escola, em casa, no campo, na estrada, em qualquer lugar.
Ler a vida e a morte.
Saber ser leitor tendo o direito de saber ler.
Ler simplesmente ler.




-0-




Texto enviado pela professora Cristina e que a Torre publica com alegria.




_________________________________________

 
Letras da Torre - Templates Novo Blogger