domingo, 13 de fevereiro de 2011

Mocras, Metralhas e Méri-Méris





Dentre as inúmeras graças com que a vida tem me presenteado sem dúvida o que mais preservo e estimo é a amizade e o carinho das pessoas.

Na minha opinião, é a maior riqueza que conquistamos ao longo da vida. E por isso mesmo procuro, à meu modo, preservá-las e alimentá-las.

Desta vez, não vou me referir a alguém em especial, mas a um grupo de amigas, reunidas em uma espécie de confraria, quase tão secreta e misteriosa quanto a Maçonaria. Menos secular, é verdade.

Pouco se sabe sobre sua estrutura interna, seu regimento e seus rituais. Desconfia-se que se reúnem virtualmente e utilizam os mais modernos recursos tecnológicos, como Internet de banda larga, tambores, pombos-correio e sinais de fumaça, sem olvidar da degustação individualizada de diversas substâncias exóticas, como vinho do Porto, salmão da Noruega e aguardentes de Cognac.

Geneticamente, segundo recentes pesquisas desenvolvidas por diversos e renomados organismos internacionais, a pedido da ONU, três vertentes confluíram para dar origem à esse movimento, cada uma delas representando as mais nobres e sapientes famílias e clãs, notadamente da Europa central e da Península Ibérica.

As Mocras, por exemplo, carregam traços lusitanos com nítidos ascendentes mouriscos. Alguns historiadores afirmam que as Mocras são descendentes de Dom Sebastião, que, sobrevivendo a Alcácer-Quibir, desposara em segredo uma princesa marroquina, enteada do Sultão Mulei Moluco.

Periodicamente alguns membros dessa família costumam peregrinar pelo mar Egeu e pela Capadócia em busca de conhecimento e enlevo espiritual. Outros, menos abastados, em atitude simbólica, fazem o mesmo, percorrendo os Shoppings Centers da região.

O grande contributo, no entanto, que as Mocras legaram à cultura sul americana, notadamente ao Brasil, foi na culinária. Seu requinte e bom gosto trouxeram para nosso país a arte de sorver um tinto do Porto e a fineza de servir à mesa sardinha portuguesa condimentada com especiarias da Índia e alecrim de Trás-os-Montes, assadas ao braseiro em telhas de barro, sobras da reforma do Mosteiro dos Jerónimos.

Não menos requintadas e cultas são as Metralhas. De origem espanhola, consta que teriam vivido aos redores de Castela quando da invasão dos Mouros à Península. O rei Mouregato teria recebido no castelo, como tributo que se impunha aos povos vencidos, uma jovem virgem dessa família. Conta a lenda que a jovem, virgem já não o era, por conta de um engano visual e a falta de tato do emissário real. E principalmente por conta de um camponês bem apessoado do feudo ao lado. A jovem, temendo ser descoberta pelo rei, da sua condição de desbravada e impura, bolou um plano para entreter o velho monarca. Todas as noites, após o jantar, ela servia ao rei uma avantajada taça de jerêz da Andaluzia. Enquanto este bebericava o vinho, ela dançava à sua frente tocando castanholas, até que o cetro real pendia para um lado e o soberano adormecia, ofuscando de baba o bordado dourado do manto. Ela então aproveitava o efeito da inebriante combinação para se refugiar nos seus aposentos. Com o passar do tempo o velho foi esquecendo-a, até que um dia ela fugiu do castelo, sem que ninguém, até hoje desse pela sua falta.

Voltando à sua terra, casou-se com o jovem camponês. Aqui há um hiato na história. Só existem novas referências a ela quando, um quarto de século depois, foi vista servindo de copeira na Sicília, ao bisavô de Don Corleone. Dizem ter sido ela extremamente fértil, sendo a principal responsável pela densidade populacional dos Apeninos. Uma de suas filhas, cujo nome Etna lhe fora dado devido à sua voluptuosidade e calor, gerou também vários rebentos. De um destes é que se originaram as Metralhas contemporâneas. Por isso, até hoje as pessoas não têm certeza se sua origem é espanhola ou italiana.

Com o advento da imigração, as Metralhas aportaram no Brasil por volta do início do século XIX. Algumas se estabeleceram no interior de São Paulo e outras mais ao sul, no antigo Campo dos Bugres, hoje Caxias do Sul; na capital Porto Alegre e também na região norte do estado, que na época era colonizada por japoneses e polacos e que se chamava Três Vendas, hoje o pujante município de Erexim.

De contribuição cultural trouxeram na culinária a paella a polenta e a minestra, sem desvalorizar o vinho e o omelete. Nas artes o rebolado, o olhar esguio e o jogar displicente dos cabelos. Oilalá...
Pessoas extremamente francas e espontâneas são capazes de passar do estágio “Dio como ti amo” ao “Vai-te-a-puta-que-o-pariu” num piscar de olhos.

As Méri-Méris, como o próprio nome dá a entender, são originárias de França. Não da França de hoje, do Arco do Triunfo, da Torre Eiffel, dos Campos Elíseos e do Nicolas Sarkozy, não!... Falo da França pré-Notre Dame. Falo da França dos Visigodos.

Quando a França foi invadida pelos povos nórdicos, Carlos, o rei, se mandou de lá, deixando seu povo à mercê dos invasores.

Então o povo pobre, que já havia na época, procurou abrigar-se junto aos mosteiros. Uma Méri-Méri, filha de um camponês que cultivava vinhas nas terras dos Bourbons, ofereceu-se como voluntária para cuidar do acervo artístico e cultural que os monges guardavam no porão do mosteiro. Foi nesse mosteiro que conheceu a bungúrdia Clotilde, esposa do rei bárbaro Clóvis I, que viria posteriormente a unir as várias tribos bárbaras que então dominavam a França.

Consta que essa Méri-Méri botou na cabeça de Clotilde que ela deveria converter o rei Clóvis I ao Cristianismo. Esse fato foi fundamental para a unificação da França e a preservação da cultura ocidental.

Não se sabe exatamente o que motivou as Méri-Méris a imigrar para o Brasil, mas alguns historiadores afirmam que foi por puro ócio, já que o rei Clóvis I, convertido, havia proibido em todo o reino a prática das brincadeiras de alcova, o que tornava a vida das moças extremamente monótona e sem graça.

Trouxeram na bagagem, além do champagne e da aguardente de Cognac, a franjinha, o pigmaleão, o corcundinha de Notre Dame e o vestido de bolinhas.

Pois bem...

Foi dessa turma que ganhamos um presente. Fomos buscá-lo na casa de uma delas esta semana. Tratava-se de uma caixa com diversos apetrechos. Dois roupões atoalhados para saída de banho, duas bolsas para viagem, das pequenas (as Méri-Méris as chamam de necessaire), alguns apetrechos para guardar coisas do banheiro e uma coleção de seis minúsculas xicarazinhas, tudo finamente decorado. Batizamos as xicarazinhas com o nome de cada uma, segundo o que nos pareceu mais apropriado pelo desenho decorativo.

Então, a postagem de hoje tem, além do seu cunho histórico, o objetivo de agradecer o carinho dessas queridas amigas que, de locais os mais diversos, se uniram para nos presentear com esse mimo, tão especial.

Obrigado de coração, gente.

(Nota importante: Amigos vestibulandos: não usem as informações desta postagem para sua próxima prova).

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4 comentários:

Meia Gotinha* disse...

ahahaahah...tou achando que esse moço da torre tem mais caraminhólas na cabeça do que a confraria da Mocras!...rs*.Mas de tudo lido, de todas risadas dadas,o que realmente fica é a sensação de um abraço!...rs*....e o agradecimento,por eu ter encontrado aki na net,pessoas do jeitinho que eu esperava encontrar e que me dão o presente diário de suas presenças..seus conhecimentos e principalmente suas sensibilidades..rs*
Felizona aki..por vários motivos:
-Pela felicidade de vcs.
-Por eu ter a oportunidade de
pertencer a esse grupo que me acrescenta tanto.
- E por eu ter conseguido comentar aki antes da vejósa mór!...ahahaahahah..( vejósa Mór!..óia eu aki antes de vc)..ahahahahaha
Bejuss nos dois!..e brigadaa!...brigadaaa1...brigada!..vcs me comoveram!..rs*

Loulou disse...

Dando um soco no ar ( em falso, e fazendo hunf!!) E não é que ela chegou premêro que eu??? Mas, hj eu nem vou falar nada, o motivo foi nobilíssimo. E ela fica sem fazer nada o dia inteiro, mesmo!! Enquanto que eu, pobrecita de mim, mourejo de sole a sole o dia inteiro hahahahaha. Corcundinha amado, Zuns querida, viajei na estorinha e, quem tem o dom, tem! e pronto! Numa narrativa deliciosa, presenteia a todas nós as Méri méris, metralhas, Mocras desse Brasil varonil.Adorei ler! Foi uma honra recebê-los em casa, conhecer o Clóvis, que é pessoa mais que querida! Marta eu nem preciso falar muito, pq já a conhecia e tenho uma ternura e carinho por ela imensuraveis.Meuzamores, obrigada pela amizade de vcs! Sou eu quem agradece o mimo de terem vindo cá em casa e passado uma tarde tão gostosa comigo. Beijos aos dois. Da Sarda Pêxa Vestida de Maire.

krika disse...

Tratando de sarda....rindo..cheguei muito primeiro que a confraria toda.
Além do que sou a madrinha do casal,com chapéu e tudo....
Nacionala ,liga não....Eles são maravilhosos amigos e fico muito feliz de vê-los juntos. Ainda mais que estou pertinho deles geograficamente....

Lu disse...

E eu não sabia disso... céus, por onde andei nesses dias?

As mocras são nota dez, ponto e basta!


Menino, tu anda escrevendo mui lindo. Bahhhhhhhh...agora fiquei dingual a vejosa ali...rss

Um beijo pra ti, pra comadre, e pras mocras!

 
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