domingo, 14 de dezembro de 2008

Balseiros - I


O oeste catarinense foi povoado por migrantes descendentes de italianos e alemães, que vieram das colônias gaúchas a partir de 1917. Esse fato contribuiu para o crescimento dos povoados, que apresentavam algumas dificuldades. Entre elas, estava a de inserir a região no contexto econômico do estado e do país, ocupando áreas desabitadas, produzindo riquezas e atendendo, assim, a lógica capitalista. Com isso, surgiu umas das primeiras possibilidades econômicas da região: a exploração da madeira, que era abundante nas florestas subtropicais e com alto valor comercial.

A madeira era levada até São Borja/RS e de lá para o Uruguai e a Argentina, onde eram comercializadas. Para transportar as toras utilizou-se do sistema de balsas, que consistia em amarrar cerca de cento e cinqüenta a duzentas toras de madeiras umas às outras. Em torno desta atividade, estavam muitos trabalhadores: os peões, que derrubavam a mata e levavam as toras, com juntas de boi até o rio Uruguai, e os balseiros, que se ocupavam no transporte das madeiras.

Esta é uma obra parcialmente ficcional. Apresenta a influência da atividade balseira no desenvolvimento econômico dos municípios envolvidos, bem como a importância desta atividade no processo de povoamento da região oeste catarinense e norte rio-grandense. Às fontes orais que fizeram parte desse processo, bibliografias e material de acervo disponíveis, magistralmente reunidos numa obra da professora Noeli Woloszyn, acrescenta-se a estória de gentes imaginárias e vivências não tanto.

Os fatos, datas e nomes citados na primeira parte de cada capítulo foram extraídos do estudo “TRABALHADORES DO RIO - OS BALSEIROS DO RIO URUGUAI” da professora Noeli, a quem envidei esforços para contatar, sem sucesso. Todos os méritos devem ser a ela creditados.

A estória que se mescla, é fruto da imaginação do autor.

(Noeli Woloszyn, Licenciada em História e Mestranda em História pela UPF. É professora na Universidade do Contestado – UnC campus Concórdia/SC.)


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Capitulo I – O Prático Fulgêncio


Ficaria na cama, naquela manhã, apesar dos gritos da mulher. Elvira estava ficando cada vez mais irascível. Conservava traços da beleza antiga. As ancas largas, os seios fartos, descaídos, mas ainda bonitos, os olhos grandes, brilhosos. Os cabelos ainda eram longos e negros. Lisos, como os cabelos de todas as mulheres da sua tribo Kaingang.
O humor dela foi o que mudou, também por culpa dele, por certo.
- Acorda, velho bêbado. Olha a altura do sol. Já faz tempo que o Tiço ta lá na faixa – gritou ela enquanto passava pela porta carregando uma grande trouxa de roupas enroladas num lençol azul. Deve ter arrumado um novo freguês, pensou. O lençol não era conhecido e parecia estar limpo, sem precisão de ir para a tábua. Um freguês rico. Só podia. Ricos é que mandam lavar roupas só por estarem um pouco amassadas e usadas uma só vez. Tanto melhor para Elvira. Não precisaria de muito sabão nem de muito bater com pau.
A cabeça dele latejava. Sentia um ardume no estômago e gosto azedo na saliva. Bebera muita cachaça na noite anterior no bar do Moura. Tardara, mais que de costume. E na cama, sozinho, pois Elvira há tempos mudara-se para o quarto do filho mais velho, que fora embora para a cidade, entre náuseas e tosses engasgadas, vinha-lhe na lembrança enevoada a conversa que Moura tivera com os baianos.
Estava ele, Natalício, o filho mais velho do Céza, e mais alguns fregueses de pouca freqüência, mas conhecidos, bebericando no balcão do Moura, quando eles chegaram.
Eram três. Baixotes, entroncados, morenos, de fala arrastada e sotaque esquisito. Pediram cachaça, num copo só que Moura serviu gelada. Um deles bebericou e cuspiu fora... Moura olhou feio; os outros, que estavam já antes no balcão ficaram em silêncio. Os baianos confabularam entre eles e pediram mais três copos de cachaça, mas que não fosse gelada. Moura serviu a contragosto da garrafa da prateleira. Pegaram dos copos e foram sentar-se a uma mesa de latão. Não se entendia o que falavam. Beberam logo a cachaça e um deles pediu mais uma. Moura novamente serviu, mas desta vez com menor má vontade, pois o que pedira a segunda pinga tirou do bolso o dinheiro e pagou as cinco, contando com a que fora cuspida fora. Moura puxou conversa, e ainda sem voltar para trás do balcão, encheu os outros dois copos.
Fulgêncio ouvira parte da conversa, sem muito entender. Eram baianos, mesmo, compreendeu dizerem.
Tomaram mais uma ou duas pingas e foram embora. Pagaram.
Quando os três baianos saíram, e nem haviam ainda sumido por detrás do pilar da ponte, Moura se viu rodeado pelos freqüentadores.
- Quem eram eles, Moura?...
- Baianos.
- Baianos? Mas a Bahia é longe e eles estavam “de a pé”...
- Vieram no caminhão. Vão trabalhar na barragem.
A Barragem! Há tempo se falava na Barragem. A ameaça da barragem só estivera tão materializada há mais de ano, quando estiveram no Goio-En os tais de engenheiros, pescrutando as margens do rio com binóculos e um foco, que armaram em cima da ponte. Falou-se deles por uns dias, depois caiu no esquecimento. Era projeto, estudo.
Agora era real. Já estavam chegando baianos para entupir o rio, e inundar tudo.
Fulgêncio e Natalício trocara um olhar e baixaram ambos, as cabeças. Ali, dos reunidos no bar do Moura, eram eles os únicos balseiros ainda vivos.
Ficaram a um canto, sentados perto da porta a olhar o rio. A noite chegara. Ora Natalício, ora Fulgêncio se aproximavam do balcão. Levava os dois copos, que Moura enchia. Ora um, ora outro voltava a sentar-se perto da porta e olhar a sombra cintilante do rio, em silêncio.
Essas lembranças somadas ao exagero da cachaça fizeram a noite de Fulgêncio ser uma noite de sonos pela metade. E mesmo essa metade de sono não era bem dormida. Misturavam-se em sonhos a imagem dos três baianos troncudos, o rio revolto nas enchentes de São Miguel, os balseiros companheiros que o acompanharam em tantas e tantas descidas, o rio subindo e logo baixando até sumir mostrando o leito seco cheio de ossos e esqueletos todos com a cara do Vicente... que ria e ria debochado... A fumaça dos casebres do lado de Santo Tomé. As chinas “francesas” vindas das colônias italianas da serra das Antas ou as polacas grandonas que diziam terem sido artistas nas europas, mas falavam português misturado com castelhano. O Salto Grande-Yucumã.

Elvira passou pela porta novamente, olhou para dentro, mas desta vez não ralhou. Decidiu levantar. Doía-lhe o corpo e a alma. Tonteou ao sentar-se na cama. Com esforço caminhou até a porta dos fundos, passando pela cozinha, onde Elvira lidava com um peixe na pia. Seus olhos estavam fundos e vermelhos no espelho. Lavou o rosto na bacia. Os olhos continuavam vermelhos no espelho. Tomou um gole de água na concha da mão. Ainda com o rosto molhado seguiu para o morro onde, na pequena roça, o feijão minguava no meio do inço. Olhou desolado o cinza das folhas murchas e seguiu para o rio, para revisar as esperas. Numa delas havia um jundiá, dos médios, noutra um dos espinhentos que só serviria para o pirão. As demais estavam com a fisga nua. Recolheu os peixes e rearmou as esperas mecanicamente. Seu pensamento estava longe. Pensava no rio e nas balsas. Nos balseiros e nas descidas. No prático Fulgêncio que fora, no companheiro Natalício, nos remadores, no cozinheiro Florão, no Vicente que sumiu nas águas do Salto Grande, nas sedas que trazia para Elvira, nas histórias que contava aumentadas, para o Tiço quando ele era pequeno, no rio que seria irremediavelmente entupido pelos baianos da barragem, logo abaixo, em São Carlos.


Uma idéia começou a tomar forma em sua cabeça. Primeiro vaga e parecida com os pesadelos da noite mal dormida, enevoada, depois absurda e impraticável. Logo em seguida possível. Logo uma meta, um projeto. Desceria o rio novamente numa balsa antes que a barragem fechasse o rio para sempre. Falaria com Natalício, reuniria os remadores ainda vivos. Encontraria Florão, que, sabia, morava em Palmas no Paraná. Alguns dos filhos do Céza poderiam substituir os remadores já mortos e aqueles vivos que tinham mudado de vida...

Quem visse Fulgêncio voltando para a casinha no Goio-Em, caminhando pela margem do rio, quase a correr carregando numa vara um jundiá médio e um espinhento pequeno, estranharia. Os mais velhos talvez revivessem a imagem de um Fulgêncio prático balseiro, os mais novos imaginariam que o velho bêbado enlouquecera.

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O HÁBITO SAUDÁVEL DA LEITURA
PROJETO “ESTÍMULO À LEITURA”


CONSIDERAÇÕES NATALINAS


Algumas pessoas me perguntam se gosto de Natal.
Então, penso... O que é Natal para mim?
Grande dúvida? Imaginem...
Natal para mim é o PROJETO “ESTÍMULO À LEITURA”.
Principalmente porque ele não acontece apenas na época Natalina...
Obviamente dirão que eu deveria festejar o nascimento de Cristo e que nesta época precisamos nos sensibilizar com a pobreza do próximo, oferecer um peru de Natal a outros, dar um presentinho acolá... Mas e os outros dias do ano? Não são Natais?
Não pensem que eu não curto fazer compras... Presentear amigos ocultos e presenciais, familiares, colegas, o vizinho bom, o lixeiro, jardineiro...
Eu apenas questiono o lado comercial tão desesperado dos comerciantes somadas as necessidades de muitos que gastam seu décimo terceiro em presentes para dar alegria as crianças ou reunir a família (tomara que sua família seja diferente, que vivam em harmonia a ceia de Natal, sem brigas e inquisições). Não sei de vocês, mas meu décimo terceiro já está reservado para janeiro.. Impostos e seguros, etc, etc.. Pessimista? Nada disso, estou otimista, e feliz, afinal pretendo entrar no ano próximo sem saldo negativo no banco...
Como vou comemorar meu Natal?
Durante o ano todo eu celebro esperanças através das leituras. Costumo dizer que meu trabalho é igual à de uma formiguinha. de passo em passo carrego um livrinho aqui, outro ali...
Neste ano então! Tive ajuda de pessoas maravilhosas, escritores, editoras, amigos. Garanto que eles também se sentem gratificados, afinal Natal é solidariedade, doação, fé, esperança, união, contribuição, projetos, idéias,
trabalho, ação conjunta,cidadania,ética,valores,virtudes...
Perdoem-me quando sou reticente a festas, ver a parada Natalina,luzes na cidade piscando.Para quem curte: Feliz Natal!
Mas se você quiser participar do meu Natal, doe um livrinho para Oficina.
Durante o ano todo você será lembrado por mim, e por todas as crianças que receberão esse presente, abraçado infinitamente não somente na noite do nascimento de Cristo.
Colocarei a seguir uma listinha de sugestões.
E antes que me esqueça vou dizer algumas palavrinhas mágicas:
Gratíssima pela sua participação!




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EDITORA FUNDAMENTOS

Coleção Destemida - autora: Natalie J. Prior - cada exemplar: 24,80

Coleção Pérola - autora: Wendy Harmer - cada exemplar: 19,60

Coleção Go Firl - autores: vários - cada exemplar: 19,60

Coleção Poderosa - autorS Sérgio Klen - cada exemplar: 28,60

Coleção Goosebumps - cada exemplar: 24,80

Coleção O Segredo das Fadas, a partir do n. 4 - cada exemplar: 24,80

Coleção Moranguinho - cada exemplar: 14,90

Coleção Polly - cada exemplar: 19,60

Escola das Estrelas - cada exemplar: 23,80

Coleção Querido Diário Otário - cada exemplar: 19,60

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4 comentários:

Anônimo disse...

hummmmm....

qual será o próximo passo do fulgêncio?

aguardando ansiosa.

beijos

Quasímodo disse...

Olá, borboletinha... Prazer em ler-te aqui.

Me perguntaram sobre a foto. Trata-se da ponte sobre o rio Uruguai, na divisa de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul, no distrito de Goio-En, município de Chapecó, SC. A margem mostrada é o lado catarinense do rio.
Daqui partiram muitas balsas levando as matas rio abaixo.

Abraços.

Anônimo disse...

Desceria Fulgêncio novamente o rio, na balsa com seus companheiros de tantas labutas e de momentos, que a memória teima trazer a tona?
É provável que sim...
E o prático, em compasso com seu coração, mente e emoção, seguia o caminho... Estava ele a sorrir, com esta possibilidade Quasímodo?

Delícia de escrito.
Beijo!



Krika, felicidades!
Projeto digno a ser seguido.
Um Feliz Natal e um 2009 de plenas realizações!

Quasímodo disse...

Prima. Quem pode saber o que vai na alma de um velho balseiro cansado?... As pessoas que o viram subir o rio pela margem, quase a correr, levando um jundiá e um peixe miudo, não relatam sobre sorriso... É possível que ele existisse. Mas o viram, (se o viram) de uma distância tal que não se poderia visualizar-lhe as feições.
Esperemos. Talvez ele nos conte se viu seu sorriso refletido nas águas... Até o momento não tenho relatos a respeito.

Beijos, amiga querida.

 
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