sábado, 4 de dezembro de 2010

Censos & Contrassensos*



Descobri, consternado, que não existo.

Não!... Não é uma reedição do “Buraco Negro” que escrevi aqui há alguns anos.

Talvez aquele texto tenha sido um prenúncio, uma antecipação do que viria acontecer.

Hoje constato que não existo oficialmente. No “Buraco Negro” era uma inexistência metafórica. Agora ela é real e definitiva. Não existo na minha casa, na minha rua, no meu bairro, na minha cidade, no meu país, na minha terra, no meu universo. Simplesmente não existo.

Não fui contado pelo IBGE.

O mundo não sabe se tenho geladeira, banheiro ou urinol. Nem se a torre em que vivo é própria, já quitada, ou se é do Abade.

Não sabe se os meus dejetos escorrem por encanamentos, pelo meio fio da calçada ou se são simplesmente jogados pela janela. (“Vai água” diriam os portugueses de antanho.)

O mundo ignora quantas refeições diárias eu faço, ou o que como no almoço, ou se requento as sobras da marmitinha para a janta, nem de quanto é meu orçamento familiar. Informações de suma importância para as ações governamentais.

Publicaram que o Brasil tem 190.732.694 pessoas. Mentira. São, pelo menos, 190.732.695. Não me incluíram na contagem.

Desde que iniciou o censo eu vivi em sobressalto, esperando o moço ou a moça do computadorzinho. Até ensaiei e decorei as respostas: não senhor, eu vivo só ... não tenho cachorro nem gato, tenho um ratinho – o Bin, e uma pomba que todos os anos faz ninho na jabuticabeira. Chuveiro? Um só. Computador? Um K6 500 mhz, mas que está com o HD baleado.

E nada!...

Um dia me chamaram do portão. Pensei: é hoje!... Não foi. Eram as Testemunhas de Jeová que seguidamente aparecem para me trazer suas revistinhas, que, aliás, gosto de ler.

Outra vez apareceu uma moça trajando um jaleco azul com uma prancheta na mão. Fiquei feliz; agora vai! Vai nada. Era a moça da saúde. Veio à minha casa para contar os aegyptis. Sobre mim, nem pó.

Então, já que não existo, vou-me embora prá Mantiqueira.

*Contrassenso: grafia alterada pelo acordo ortográfico - contra-senso.
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9 comentários:

krika disse...

Querido amigo, tudo isso pra contar que vc vem pra Mantiqueira?
Só você mesmo! Seja bem-vindo ao vale, eu já estou aqui!

retalhos disse...

sorrindo....
eese amigo ki doru...é mesmo uma figura...ainda bem que vem pra perto...vamos rir..muito ainda...nem existe mesmo, por isso a moça do censo num passou...igual você nem existe....num tem opção ( pessoas especias purdimais)

beju migokidoru

M A R I Z A disse...

Beijos, passei para um chimarrão e aproveito enquando cevas a erva e a água fica no ponto...fico a passar meus olhos em seus textos que sempre me encantam. beijos beijos e mais beijos

Quasímodo disse...

Krikita, amiga. A Torre está saudosa de suas matérias. Ânimo...

Esse vale tem uma magia difícil de explicar. Gosto de entardecer olhando as montanhas azuladas da Mantiqueira, onde, para além, vivia uma amiga muito querida. Melhor que agora ela está do lado de cá.

Beijão.

Quasímodo disse...

Amiga dos Retalhos.

Você me deixou ruborizado. Vamos sim, rir muito ainda.

Afinal, como diziam meus colegas, sou capaz de rir até de fratura exposta.

Dorutu pordimais tumém.

Quasímodo disse...

Mariza... com "Z"...

Obrigado por passar os olhos. Falta ainda passar por cá, para matearmos sob a sombra da jabuticabeira. Garanto que antes de lavar a erva, botamos todos os assuntos em dia.

Beijo, amiga.

Loulou disse...

Adorei teu bom humor para relatar uma injúria cometida contra ti pelo "censo"......que nada tem de comum........baijos queridote da Vestida de Mar"

Quasímodo disse...

Pexa... Doce sereia vestida de mar...

Bom te ver por cá. Mas ainda não me esqueci do "Bocó"...

Baijos, também...

krika disse...

" Cê fez eu chorá!"

 
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